Transformar Linha 18 em um BRT seria um descalabro

Pedido do consórcio de prefeitos do ABC para mudar linha de monotrilho revela a total falta de visão dos políticos no Brasil
Estação da Linha 18-Bronze: visual mais leve e moderno
Estação da Linha 18-Bronze: governo deve arcar com custo por conta do cancelamento do projeto
Estação da Linha 18-Bronze: visual mais leve e moderno
Estação da Linha 18-Bronze: projeto já consumiu milhões e prefeitos da região querem jogá-lo no lixo

Soa como uma piada de mau gosto a proposta do Consórcio Intermunicipal do Grande ABC, que reúne os prefeitos de Santo André, São Bernardo e São Caetano, para que o projeto da Linha 18-Bronze do Metrô passe de um monotrilho para um BRT. Curiosamente, o pedido parte do prefeito de São Bernardo, Orlando Morando, do mesmo partido do governador Geraldo Alckmin, o PSDB.

Em declaração ao jornal Diário do Grande ABC, Morando disse que “a população clama por um novo modal”, sem dar detalhes de como chegou a essa conclusão. O longo atraso no início das obras da linha de monotrilho, uma PPP vencida pelo consórcio VEM ABC e que teve o contrato assinado em agosto de 2014, se dá pela falta de recursos para desapropriação dos terrenos necessários para o projeto.

O governo do estado esperava por um repasse a fundo perdido do governo federal dentro do PAC, mas o dinheiro nunca chegou. Nesse meio tempo, a gestão Alckmin tentou obter um empréstimo no exterior, mas novamente o governo federal barrou a tentativa alegando falta de capacidade de pagamento do estado. Hoje, o problema segue sem solução, com o estado tentando autorização para se endividar. Enquanto isso, o VEM ABC diz ter focado no projeto executivo da Linha, demonstrando ter interesse no projeto mesmo após três adiamentos.

Maus exemplos

À essa altura, mudar completamente o projeto é um sinal claro da falta de preparo da classe política no Brasil. O ABC sofre com uma mobilidade deficiente que só pode ser resolvida em seu eixo principal pelo transporte ferroviário, segregado da malha urbana. A proposta dos prefeitos da região é manter o traçado e criar viadutos e trechos elevados em pontos críticos, mas de resto trata-se de um corredor que irá interferir no cotidiano da população.

A demanda projetada pela linha, de mais de 300 mil pessoas/dia, também seria atendida no limite e não haveria meios de ampliá-la dada a restrição de circulação de ônibus. Mais do que isso é o fato de o projeto da Linha 18 ter consumido milhões de reais que seriam desperdiçados numa mudança radical como essa.

Corredor ABD: nascido para ter apenas trolébus, corredor tem ônibus a diesel e anda saturado (Igor Martinez)

Outra questão envolve a integração tarifária: como parte da rede metroferroviária da Grande São Paulo, a Linha 18 oferecerá a possibilidade de chegar a qualquer uma das mais de 150 estações das 14 linhas que deverão existir na época em que for aberta. Tudo isso pelo preço de uma tarifa. Já um BRT não estaria integrado necessariamente a outro modal, assim como ocorre com o corredor ABD administrado pela Metra.

Aliás, esse corredor é o exemplo claro de que o ABC precisa de metrô e não mais ônibus – coincidentemente, um veículo fabricado na região. O que parece difícil de entender para alguns especialistas é que a atratividade das linhas do Metrô e da CPTM está na integração e no ambiente controlado e seguro, algo que um BRT não consegue oferecer. Basta ver a demanda baixa do Expresso Tiradentes, que mesmo segregado, poderia atrair mais passageiros se fosse integrado ao Metrô, por exemplo.

Apesar do absurdo do pedido, o governo do estado negou qualquer alteração: “A Linha 18 permanece na lista de prioridades do governo, que segue envidando esforços para captação dos recursos. O governo de São Paulo reivindica ao governo federal a revisão dos critérios de rating dos Estados. A metodologia adotada pela Secretaria do Tesouro Nacional não leva em conta a situação financeira de São Paulo diante do cenário de crise no resto do País”, declarou em nota publicada no jornal.

De fato, é irônico que o estado de São Paulo ainda mantenha ativos vários projetos de infraestrutura e seja considerado incapaz de assumir um financiamento enquanto outros entes da federação receberam rios de dinheiro para obras que em muitos casos não chegaram a ser completadas. Isso não significa que não esteja faltando interesse da gestão Alckmin em resolver o problema, inclusive com a participação das prefeituras da região, uma das mais industrializadas do Brasil. Em vez de sugerir ideias estapafúrdias, os prefeitos poderiam buscar recursos para ajudar nas desapropriações, por exemplo.

 

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3 comments
  1. Olá Ricardo como vai? Gostaria de fazer uma pequena correção se me permite,
    o expresso tiradentes no qual você citou, está ligado a estação Sacomã da linha verde e a Pedro II da linha vermelha, eu moro do lado de uma das estações do expresso e ele é bem útil quando preciso me deslocar até a linha vermelha, pois ao invés de ir até o sacomã e realizar duas baldeações, fica muito mais rápido ir para estação Pedro II . Quanto a mudança de modal citada no post, também acho um absurdo, moro perto da estação tamanduatei também, estou na torcida para que essa linha em forma de monotrilho possa começar a ser feita algum dia, será muitíssimo útil sem dúvida alguma.

    1. Olá, Rafael, tudo ótimo. E você? Acho que não fui claro, acho o Expresso útil, mas ele tem um potencial enorme se fosse transformado num metrô leve e passado para o estado, com integração tarifária com o restante da rede. E justamente pelo que você falou: ele está integrado fisicamente com as estações Sacomã e Pedro II e também poderia ser integrado com a Linha 15. Nesse formato, ele certamente estimularia o desenvolvimento desse eixo da avenida do Estado que em muitos trechos é decrépita. Abraços e obrigado pelo comentário.

  2. Olá Ricardo, tudo bem? Sou mais um entusiasta metroferroviário, e acompanho quase que diariamente todos os fóruns das linhas da CPTM e do Metrô Paulista no Skyscrapercity. Vejo muitos posts seus lá, inclusive. Sei que lá, nos fóruns específicos do Expresso Tiradentes, já se discutiu muito esse tema, mas como ainda não tenho cadastro lá, então… Permita-me te fazer de vítima: você acha viável num futuro mais promissor financeiramente transformar o Expresso Tiradentes em Metrô de superfície, como a linha 3? Trabalhei na Faculdade Belas Artes, e dois professores mestres em arquitetura comentaram certa vez que seria possível reforçar as estruturas dos elevados para suportar o peso maior e constante dos trens. Talvez uma nova linha de monotrilho, em Y como a Linha 17, ligando Vila Prudente e Sacomã com a Zona Norte, em algum ponto próximo do Campo de Marte, passando por Pedro II, e até mesmo com a futura Estação Bom Retiro na região da Luz… Acredito que os ônibus poderiam percorrer as vias normais durante as obras. O que achas? Abraços e parabéns pelo site.

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