O governo do estado de São Paulo publicou há alguns meses o edital da PPP do Trem Intercidades (TIC) e da Linha 7-Rubi. O tão aguardado trem entre Campinas e São Paulo poderá trazer inúmeros benefícios. Mas, apesar disso, o projeto apresenta uma potencial deficiência.
É de conhecimento amplo que o preço das tarifas é determinante no uso do transporte cotidiano. Os passageiros sempre buscam por opções mais baratas e viáveis, não é por menos que o modal ferroviário se destacou por décadas, graças a modicidade tarifária.
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Entretanto, para quem mora nas cidades de Campinas, Vinhedo, Valinhos e Jundiaí, a situação talvez não seja a esperada. A população desta região pediu de forma reiterada por um trem metropolitano, uma espécie de extensão da Linha 7-Rubi, para que a população destas cidades fosse plenamente atendida.
O desejo, então, começou a tomar forma com a PPP do TIC-Eixo Norte. O serviço TIM promete ligar as quatro cidades com um trem metropolitano no padrão daqueles utilizados hoje pela CPTM com intervalos bem compatíveis. Tudo para dar certo, correto?

Nova lógica de preços
Visando promover uma renovação e, até certo ponto, diminuir o aporte do estado sob o transporte de caráter metropolitano, de cunho social, a gestão paulista decide por reformular a lógica tarifária do TIM. Se os passageiros do trecho entre Campinas e Jundiaí esperavam pagar o mesmo valor, atualmente de R$ 4,40, nos trens paradores é melhor começar a planejar as finanças.
O site fez uma matéria abordando uma possível mudança na lógica tarifária que hoje mostra seus dentes. Pouco visível no edital de concessão, o passageiros deverá pagar uma tarifa diferenciada para andar no trecho entre Jundiaí e Campinas. Agora será cobrada uma taxa por quilômetro percorrido.

Segundo apresentação realizada no Fórum de Mobilidade da ANPTrilhos, o passageiro deverá custear cerca de R$ 0,32 por quilômetro percorrido. Aparentemente um valor justo, não fosse pelas distâncias enormes neste trecho.
A título de comparação, observe o valor da tarifa de um passageiro que tenha como origem a estação Campinas e queira se deslocar para outras cidades até Jundiaí.
- Campinas – Valinhos = R$ 4,19
- Campinas – Vinhedo = R$ 6,78
- Campinas – Louveira = R$ 9,12
- Campinas – Jundiaí = R$ 14,04
- Jundiaí-Vinhedo = R$ 7,20
O valor da tarifa por quilometragem percorrida pode beneficiar muito os passageiros que desejam realizar viagens entre cidades vizinhas, já que estes vão pagar tarifas inferiores aos ônibus.
Exemplificando, um passageiros que tenha como origem a cidade de Campinas e queira ir até Valinhos. Utilizando a ferrovia pelo serviço TIM ele pagará R$ 4,19. O valor da tarifa do mesmo trajeto via ônibus intermunicipais da EMTU varia de R$ 4,90 até R$ 5,45.

Agora, se o mesmo passageiro que parte de Campinas tiver como ponto final a cidade de Vinhedo a situação se inverte. A tarifa para o TIM chega à R$ 6,78 enquanto o valor do ônibus intermunicipal da EMTU varia de R$ 5,25 até R$ 5,45

Outro exemplo, um passageiro que parte da Jundiaí com sentido a Vinhedo tem como opção um ônibus suburbano com tarifa em R$ 6,05. Se o passageiro optar pelo trem ele vai gastar R$ 1,15 a mais na viagem.

No caso mais extremo, o passageiro que partir de Jundiaí para Campinas, e vice-versa, vai pagar uma tarifa de R$ 14,04. Esse valor é mais barato que a tarifa do ônibus rodoviário, que atualmente custa R$ 17,20, porém, com nível de conforto completamente diferenciado em relação ao trem metropolitano. Neste cenário a operadora de ônibus poderia inclusive oferecer um serviço equivalente ou mais barato para competir com os trens de passageiro.

Pensando mais no “cliente” do que no passageiro
Adotando-se a lógica de menosprezar o passageiro e enaltecer o “cliente”, cria-se então uma relação de mercantilização do transporte metropolitano de passageiros de cunho social, desvirtuando-o, para transformá-lo em unidade de negócio.
Quem será beneficiado de fato pelo TIM? Poucas pessoas que talvez usem o trem para driblar as dificuldades impostas pelo ônibus, sobretudo no que se refere ao tempo de viagem. Mas, qual será o preço disso?
Certamente um passageiro esporádico não vai se importar de gastar alguns reais a mais para pegar um trem mais rápido que o serviço rodoviário. Mas quem utiliza o sistema de forma regular vai pensar duas vezes antes de optar pelo trem. Neste ponto o TIM reduz seu potencial como meio de articulação entre a Região Metropolitana de Campinas e a Região Metropolitana de Jundiaí.
O transporte metropolitano de passageiros tem mais funções do que deslocar pessoas entre estações. Sua relação com o território, associada à modicidade tarifária, cria dinamismo entre as regiões. Um passageiro que reside em Jundiaí poderia, por exemplo, frequentar constantemente a cidade de Campinas para o trabalho, compras, lazer, etc.

Com a tarifa mais cara, esse potencial passageiro se vê desestimulado a usar o trem. Vai preferir usar modos mais econômicos como o ônibus ou ficar restrito à própria cidade. Municípios menores que poderiam se beneficiar de mais passageiros utilizando os serviços locais podem se ver frustradas diante de uma baixa quantidade de passageiros, fruto de tarifas elevadas.
Em suma, os cidadãos que tanto pediram por uma extensão do trem metropolitano, nos padrões de operação da CPTM, receberão um verdadeiro “cavalo de troia”. Assim como diz a antiga história grega, o presente aparentemente exuberante e belo na verdade escondia uma armadilha.
Como forma de manter em pé a viabilidade do TIC entre Jundiaí e Campinas, priorizando os interesses do operador privado, eleva-se a tarifa do TIM e desperdiça-se um enorme potencial de transformação das duas regiões. Uma vitória para os “clientes” e uma derrota aos “passageiros”.
Nota do editor: artigo de opinião não refletem necessariamente a posição deste site.