Com novo edital, governo vai garantir R$ 13,5 bilhões de receita para a futura operadora do TIC Campinas

Novas cláusulas fixam receitas de referência para o novo serviço, garantindo estabilidade no faturamento. Em contrapartida, contrato prevê tarifas médias 20% menores que o teto de R$ 64,00
Trens expressos deverão ter tarifa média de R$ 0,50 (Uwe Schwarzbach)
Trens expressos deverão ter tarifa média de R$ 0,50 (Uwe Schwarzbach)

O edital do Trem Intercidades (TIC) foi republicado na semana passada e trouxe consigo uma série de modificações, sobretudo financeiras. Uma das mais importantes é a garantia de R$ 13,5 bilhões na receita do Serviço Expresso que será operado pela iniciativa privada.

Para compreender este e outros valores é preciso recapitular alguns tópicos importantes e explanar as novas regras do contrato em relação à tarifa do TIC. Abordaremos parte a parte os pontos mais relevantes do novo edital.

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Tarifas praticadas

O governo do estado estabeleceu uma série de tarifas para a operação do trem entre São Paulo e Campinas. A camada Tarifa Teto do Expresso são os valores máximos que podem ser praticados na venda de passagens. Os valores atualizados são de:

  • R$ 64,00 entre Barra Funda e Campinas
  • R$ 35,90 entre Barra Funda e Jundiaí
  • R$ 28,10 entre Jundiaí e Campinas.

A concessionária poderá praticar tarifas abaixo deste valor por sua conta e risco oferecendo, por exemplo, pacotes promocionais. Da mesma forma, o contrato permite a flexibilidade para se ultrapassar a tarifa teto. Neste caso, 20% do trem deverá ter uma tarifa de “primeira classe” e 80% com valores módicos estabelecidos em contrato.

Fachada da estação Campinas (Jean Carlos/SP Sobre Trilhos)

Exigência de tarifa média menor R$ 64

Uma novidade do contrato é a exigência de se manter uma tarifa média para o Serviço Expresso. Os valores praticados na tarifa teto consideram o custo de R$ 0,64 por quilômetro rodado. O governo quer garantir uma tarifa média de R$ 0,50 por quilômetro rodado.

Isso significa, por exemplo, que a tarifa média dos trens entre São Paulo e Campinas deverá ser de R$ 50,00. Isso representa um desconto de 21,87% do valor da tarifa teto. Os valores de tarifa média praticada serão aferidos anualmente.

Tarifa média para o TIC (SPI)
Tarifa média para o TIC (SPI)

Caso a concessionária deixe de cumprir o regramento há a possibilidade de reajustar os valores no ano seguinte, para compensar o excedente financeiro. Caso haja descumprimento a concessionária será multada em R$ 400 mil, segundo a cláusula 72.4 do Anexo V. Penalidades.

Receita Tarifária de Referência do Serviço Expresso

O novo mecanismo contratual inserido na republicação da PPP do Trem Intercidades atua como um instrumento garantidor de receitas para a concessionária. O primeiro ponto é compreender a função da tarifa de referência.

A tarifa de referência é uma estimativa de receita que o Serviço Expresso deverá obter ao longo dos anos. Esse valor é calculado a cada três meses a partir do sexto ano de concessão e se estende durante 24 anos de operação restante.

Receita tarifária de referencia do serviço expresso (SPI)
Receita tarifária de referencia do serviço expresso (SPI)

Conforme mostra a tabela, a estimativa de receita do TIC no primeiro trimestre de operação será de R$ 123,4 milhões. Esse valor progride anualmente até o 30º ano de concessão, onde a previsão de receita é de R$ 187,8 milhões por trimestre, cerca de 52,18% maior que no período inicial.

Quando somados, o valor de receita operacional para o Trem Intercidades entre São Paulo e Campinas, durante 24 anos de operação, será de R$ 15,02 bilhões.

Garantia de Receita

A garantia de receita é uma regra que tem como base a Tarifa de Referência. Em tese a concessionária teria bandas de mitigação para evitar o prejuízo na operação do serviço.

A ideia é que o governo possa garantir o montante entre 90% e 110% das tarifas de referência para a concessionária. Os mecanismos foram criados para permitir previsibilidade nos ganhos da empresa privada.

Caso a concessionária obtenha receita real abaixo dos 90% o governo será obrigado a repor a diferença integralmente. Por exemplo, se a concessionária obtiver 75% do estimado para o período, o governo deverá pagar a título de equilíbrio o montante de 15% restantes, garantindo a receita mínima de 90%.

Formula para cobertura tarifária em caso de receita inferior à 90% (SPI)
Formula para cobertura tarifária em caso de receita inferior à 90% (SPI)

Agora, caso a concessionária obtenha receita maior que 110% do estabelecido em contrato, deverá haver rateio do excedente com o governo. Por exemplo, se a concessionária obtiver receita de 130% do período, o valor excedente, neste caso 20%, deverá ser dividido entre governo e concessionária. O governo ficará com metade deste valor, ou seja, 10% da receita, e a concessionária também ficará com o mesmo valor a título de lucro.

Formula para cobertura tarifária em caso de receita Superior à 110% (SPI)
Formula para cobertura tarifária em caso de receita Superior à 110% (SPI)

Seguindo esta metodologia tarifária, o governo concederá para a concessionária, de forma garantida em contrato R$ 13,5 bilhões, que representa 90% da tarifa de referência de toda a operação do TIC.

Reajuste de tarifa

O reajuste de tarifa deverá ser realizado anualmente e incidirá sobre o valor da tarifa teto e sobre o valor da tarifa de referência. A partir do sexto ano do início da fase de construção, a tarifa será reajustada levando em consideração a variação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o Índice Nacional de Custo da Construção (INCC) e da energia elétrica:

Tarifa Teto original * [(50% IPCA/IPCA base)+(40% INCC/INCC base)+(10% Energia/Energia base)]

Os valores de variação consideram o valor dos índices no período base com os valores no período de referência do reajuste.

Após a fase de construção a tarifa será reajustada levando em consideração apenas a variação do IPCA e da energia elétrica:

Tarifa do 6º Ano*[(85% IPCA/IPCA 6º ano) + (15% Energia/Energia 6º ano)]

O reajuste tarifário é também adotado para a Tarifa de Referência, seguindo a mesma metodologia. Neste caso, o contrato versa sobre o Ajuste de Receita Adicional, onde os valores obtidos pela concessionária são comparados com os valores atualizados anualmente.

Dependendo da diferença de receita, o governo poderá pagar valores adicionais para a concessionária. Em caso de deflação das receitas, a concessionária deverá repassar valores ao governo.

Serviço expresso será reajustado anualmente (GESP)

Pensamento otimista?

Um pequeno exercício financeiro pode elucidar se as estimativas do governo são otimistas diante de um cenário de garantia de receitas. Fizemos um cálculo para definir a receita de operação do TIC no ano de 2031 (considerando apenas a tarifa base).

Estimativa de demanda para o TIC (IFC)
Estimativa de demanda para o TIC (IFC)

O primeiro passo é obter a receita de viagens realizadas por dia. Para isso obtivemos as estimativas de demanda no cenário 2031. A fórmula para a obtenção da receita é a seguinte:

((7.940+7.684)*R$ 64)+((12.011+15.788)*R$ 35,90)+((391+198)*R$ 28,10))
=R$ 2.014.471,00

O resultado das viagens é uma receita tarifária de R$ 2.014.471,00 ao dia. Levando em consideração que a receita média será de R$ 0,50 por quilômetro aplicamos este valor ao cálculo. A relação da tarifa máxima para a tarifa média é de 78,12%.

R$ 2.014.471,00 *0,7812 = R$ 1.573.704,7452

O valor de R$ 1,5 milhão deve ser multiplicado pelos 30 dias do mês durante 3 meses, ou seja, por 90 dias.

R$ 1.573.704,7452 * 90 = R$ 141.633.427,068

Este é o valor que a concessionária poderá obter no primeiro trimestre de operação do TIC, segundo as estimativas de demanda para o ano de 2031 e seguindo a tarifa média de R$ 0,50 por quilômetro.

Diante deste cenário podemos aplicar a fórmula para verificar quando o governo poderia receber de receita. O cálculo é o seguinte:

R$ 141.633.427,068-(1,1*R$ 123.448.373,15)  =
R$ 5.840.216,60 ÷ 2  =
R$ 2.920.108,30

Portanto, seguindo a estimativa de demanda, tarifas e projeções para o TIC em 2031, o governo poderia obter parte das receitas operacionais, que neste caso seria de aproximadamente R$ 2,9 milhões.

Porém, supondo que o TIC tenha um faturamento muito menor do que o estimado, chegando até R$ 100 milhões, o que representaria cerca de 70% da receita no melhor cenário, quanto o governo deveria pagar para a concessionária? Aplicando-se a seguinte fórmula é possível ter uma estimativa:

(0,9* R$ 123.448.373,15)- R$ 100.000.000,00=
R$ 11.103.535.835

No caso da concessionária obter receita menor do que o esperado, o governo deverá realizar o ressarcimento em favor da concessionária. No exemplo acima o prejuízo hipotético de R$ 11,1 milhões é bancado integralmente pelo governo.

A formulação no geral garante maior segurança para a empresa privada ao fazer seu investimento, tendo em vista que não poderá faturar menos do que 90% das estimativas do governo. Mas se houver lucro, esse valor não será integralmente compartilhado com estado.

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18 comments
    1. Viva o capitalismo Tarcísiano! Capitalismo Tucano na alma!!! Não há Ministerio Publico Estadual? Tribunal de Contas do Estado?
      Isto sim é comunismo! distribuindo dinheiro público com “empreendedores” kkkk

  1. O lamentável é que com o TIC o serviço 710 deixará de existir atrapalhando a vida de muita gente, pois vai sobrecarregar a linha 3 do metrô. Se ao menos o trem que vem de Rio Grande da Serra tivesse ponto final na Barra Funda seria melhor.

    1. Pois é. Tecnicamente as “linhas” 7 e 10 sempre foram uma só Linha, a antiga EF Santos Jundiaí – sendo dividida, equivocadamente, quando a CPTM a assumiu lá nos anos 90.

  2. Contrato sem risco nenhum, só garantia de lucro, é por isso que privatização não funciona, antes tinha um edital com regras e cláusulas um pouco mais justas, que iriam fazer a iniciativa privada ter que desembolsar uma grana investindo, mas a CCR e outros grupos não se interessaram, fizeram lobby pra mexer no edital e agora o governo provavelmente vai ser forçado a desembolsar bilhões só pra sustentar a concessionária, capitalismo dependente brasileiro é assim mesmo, não tem outro caminho que um edital desses teria ido.
    Por isso que esse tipo de serviço tem que ser público, com as estatais, pelo menos maior parte do dinheiro investido vai pra a operação e melhorias reais, imagina oq a CPTM poderia fazer com acesso a 13,5 bilhões pra gastar, mas quando esse dinheiro vai pra a iniciativa privada, acaba quase tudo em bolso de acionista

    1. O problema é que continuando com a CPTM ficamos a mercê desses sindicatos políticos que não propõem nada alternativo ao que o Governo está fazendo. E aí a população paga o pato sempre porque o sindicato só representa interesses políticos e ideológicos.

      Acho que isso é porque o projeto deve ser bem ruim. Se não fosse tão ruim, talvez haveria outros interessados que assumissem esse risco e aí o Governo não faria isso, até pq acho que já sei quem vai ganhar essa concessão.

    2. É nesta formula a exemplo que no entendimento de alguns “experts”, as linhas entregues para concessão por terem sido “incompletas” como as 4, 5, 8 e 9 devem permanentemente receber aportes financeiros permanentes do Estado com risco ZERO neste cambalacho perfeito que seguindo as estimativas de demanda que comprovadamente foram superestimadas, tarifas e projeções para o TIC em 2031, o governo deverá continuar realizar o ressarcimento em favor da concessionária que repassara parte do lucro aos acionistas.
      A atual administração está propositalmente deixando de investir em manutenção na CPTM para que a qualidade dos serviços caia drasticamente. Em assim sendo, a população reclamara e dá-se o processo de concessão.
      Se por um lado as propagandas midiáticas pedem para se utilizar o transporte público em detrimento do individual, na prática se tem um governo entreguista despreocupado e descompromissado com a mobilidade pública cuja preocupação maior é fazer concessões dispersas e aleatórias sempre com fins eleitoreiros, o site Metrô/CPTM deveria fazer uma reportagem para demonstrar as condições que os passageiros dos trens metropolitanos viajam.

    3. Como justificar uma coisa dessas? Cadê os defensores da “iniciativa privada”? Um verdadeiro crime aos cofres do estado e ao patrimônio Paulista.

  3. Desculpa te decepcionar, mas privatizando os sindicatos continuarão os mesmos, visto que continuam na mesma base sindical. Como o que ocorreu nas linhas 8 e 9 que continuam com sindicato da sorocabana. Te aconselho a estudar mais.
    mas aí você vê a mentalidade da cidadã, que mesmo enxergando os malefícios da concessão, é a favor por causa de ser contra “sindicato”, sem saber que o sindicato vai continuar o mesmo, e mesmo que não fosse, seria outro, pois o sindicato é o representante legal de qualquer categoria.
    Não duvido nada que votou no “mito”, que luta contra o “comunismo”, não gosta de vacina e acredita na terra plana.

  4. Dinheiro público usado para isso… O estado vai bancar o lucro da concessionária, tá de sacanagem

  5. O governo está certíssimo. Não entendo quem está reclamando. Se queremos qualidade nos trens privatizados de São Paulo o governo tem obrigação de liberar bilhões e repassar diretamente para as concessionárias para que possa garantir a elas uma manutenção dos trens e do atendimento e também garanta um bom lucro, afinal não é fácil achar no mercado quem tem o expertise de empresas como a CCR que estão dispostas a correr esse risco. E se o governo não tiver esse dinheiro que aumente a passagem para 10, 12 ou 15 reais. Chega de estatais, é a vez da empresa privada cuidar de São Paulo. Eu como empresário e investir estou feliz com o governador Tarcísio porque ele está no caminho certo.

  6. Deixo meus parabéns ao excelente artigo, o qual deve ser compartilhado ao máximo.
    É notório o esforço do governo paulista em viabilizar o TIC e o TIM, junto com a linha 7-rubi, para a iniciativa privada. Todo malabarismo contratual para tal, envolvendo fortunas do dinheiro público para mitigação de risco ao investidor, seria desnecessário se a própria CPTM operasse o serviço.
    Esse montante bilionário poderia ser investido na excelência do serviço e ainda sobraria muito para investir em outras necessidades da sociedade, como saúde e educação.
    Insustentável economicamente para o governo paulista a médio e longo prazos. É a conclusão que se tira ao ler o artigo, ou seja, num futuro próximo, com todo certeza, se assim acontecer a concessão, os cidadãos que pagarão por essa conta com tarifas muito mais caras.

  7. Chama a atenção que as demandas para o TIC até Campinas estimadas foram para somente após 2040 e não após sua implantação em 2024, com 49 mil /dia /ano/12 milhões de passageiros ou ainda mais longe 2050 com 59 mil /dia /ano ou 13 milhões de passageiros, desta forma tem-se a justificativa perfeita para uma farsa de previsão superavaliada da demanda, ou seja muito maior que ela realmente terá lembrando que a Linha 13-Jade possui demanda de 11,5 mil/dia.
    E neste cambalacho perfeito que seguindo as estimativas de demanda que comprovadamente são superestimadas, tarifas e projeções para o TIC em 2031, o governo poderia obter parte das receitas operacionais, que neste caso seria de aproximadamente R$ 2,9 milhões, porém na hipótese que o TIC tenha um faturamento muito menor do que o estimado, o que é uma certeza, chegando até R$ 100 milhões, o que representaria cerca de 70% da receita no melhor cenário, o governo deverá realizar o ressarcimento em favor da concessionária.
    A formulação no geral garante maior segurança para a empresa privada a exemplo do que já acontece com outras concessões, ao fazer seu investimento, tendo em vista que não poderá faturar menos do que 90% das estimativas do governo. Mas se houver lucro, esse valor não será integralmente compartilhado com estado.
    Qual a finalidade de se dar prioridade a um TIC em detrimento aos Trens metropolitanos que possuem demandas múltiplas vezes maiores e fazer concessões, se o governo do Estado faz um malabarismo e banca e continua pagando obras inclusive como participação nos preços das passagens e todas as despesas com a CCR de São Paulo com a ViaMobilidade inclusive com reajustes abusivos do pedágio R$35,20 no sistema Anchieta Imigrantes, tais fatos são omitidos de forma sorrateira da população, e poucos tem conhecimento, só a partir destas informações é que poderemos avalizar esta concessão se foi benéfica ou não!?
    Já passou a hora do TCU-Tribunal de Contas do Estado e MPE-Ministério Público Estadual, deveriam ser mais atuantes atentos e rigorosos investigando com lupa estas perniciosas avaliações inclusive as da região do ABC, licitações, concorrências e concessões estão sendo utilizadas como futuros trampolins políticos que estão causando enormes prejuízos para o Estado e não se deixar enganar por governantes e dirigentes demagógicos em que o discurso é um e a pratica é outra.

  8. Esse malabarismo contratual é similar ao que aconteceu com a Linha 4-Amarela, que o contrato prévia construção e operação, assim como a Linha 6-Laranja. A mão invisível do “mercado” esperneou, chorou, fez beicinho até que o GESP assumiu a construção da linha e a CCR entrou só com a construção do CCO e a compra de trens.

  9. Essa “privatização” está custando cada vez mais caro… lembrando que a parte generosamente bancada pelo governo será paga com o NOSSO dinheiro.

  10. repito o que venho falando aqui faz tempo: TODOS estes projetos de TIC nao param de pe, tem que ser cancelados para ontem e parar com este assunto de uma vez por toda !!

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