A pandemia de Covid-19 foi um verdadeiro tiro no peito para as empresas de transporte. As grandes companhias se sustentam através da quantidade massiva de passageiros que utilizam seus serviços a um custo que é considerado “baixo” ante às despesas operacionais. Manter um Metrô ou uma CPTM é um desafio tremendo que vem sendo enfrentado por gerações de grandes administradores.
Alguns desses grandes diretores enfrentam pedras e obstáculos, mas coube a atual presidência da CPTM passar por cima de uma montanha. A queda abrupta da demanda aliada à urgência de modernizações fez com que a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos registrasse um prejuízo histórico. Em meio à essa turbulência entra uma grande reforma que será promovida através concessão de duas das suas linhas mais importantes, a 8-Diamante e 9-Esmeralda.
O prejuízo
Foi divulgado no Diario Oficial do Estado de São Paulo o resultado contábil da CPTM referente ao ano de 2020. Nele o aterrador e esperado número surge: R$ 963 milhões de prejuízo, o que representa um aumento de 646% em relação a 2019. Apesar do desastroso valor, é necessário deixar claro que essa era uma situação praticamente inevitável.
Devemos analisar as principais despesas da empresa para compreender de onde partiu esse enorme rombo financeiro. Primeiramente indicamos o óbvio: a queda do volume de passageiros transportados. Apesar de não termos dados oficiais, que deverão ser plenamente divulgados no relatório de administração, é evidente que essa queda do número de cidadãos transportados impacta diretamente nas contas da empresa. No ano de 2019 a receita da companhia foi de R$ 2,716 bilhões, enquanto em 2020 esse valor caiu para R$ 2,131 bilhões, ou seja, uma queda de R$ 585 milhões na receita.
As despesas administrativas cresceram nesse período passando de R$ 262 milhões para R$ 486 milhões. A CPTM até conseguiu economizar em algumas áreas como a diminuição das despesas financeiras, mas não foi o suficiente para mitigar o prejuízo final. Cabe falar também que durante esse período a empresa manteve suas operações próximas a 100% além de ter gastos extras com insumos de higiene e limpeza. Os custos de operação pouco variaram e estão na faixa dos R$ 2,3 bilhões. Abaixo segue uma imagem resumida do resultado apurado até 31 de Dezembro de 2020.

Concessão das Linhas 8 e 9
Em meio ao caos financeiro, a CPTM se prepara para perder parte significativa da sua malha com o leilão das linhas 8 e 9. A concessão patrocinada, uma vez que existe remuneração estatal para a futura operadora, retirará das mãos da CPTM importante parte da malha. Alijada de suas melhores linhas, a companhia precisará se reinventar se quiser continuar existindo como empresa de referência. Apesar disso a promessa é que a concessão traga uma grande quantidade de investimentos necessários a curto prazo, o que poderá mudar a qualidade da linha durante os primeiros anos de operação.
A manutenção dessa qualidade vai depender justamente da competência da nova operadora. Uma série de players experientes demonstrou interesse na concessão, inclusive a CCR, que atualmente a detentora de três das quatro linhas que foram concedidas para a iniciativa privada, sendo elas as linhas 4-Amarela, 5-Lilás e 17-Ouro. A linhas 15-Prata, apesar de arrematada, teve o certame anulado pela Justiça. Empresas como CAF, Acciona, Patria, Alstom, Odebretch e Itapemirim também estão interessadas e contam com expertise e capacidade financeira para promover uma disputa forte.
Outorga maior e preparações para o julgamento
O secretario Alexandre Baldy já designou a Comissão Especial de Licitação para julgar e examinar todos os documentos e procedimentos relativas a concessão das Linhas 8 e 9. Essa equipe é composta por dez membros que não serão remunerados pela apreciação da documentação que for apresentada pelas empresas vencedoras.
Na mesma semana, a Secretaria dos Transportes Metropolitanos atualizou o valor da outorga fixa a ser paga pela concessionária que arrematar as Linhas 8 e 9 da CPTM. A mudança já havia sido aplicada com os indicadores de janeiro/2021 mas, com o adiamento do leilão para abril, os indicadores foram reatualizados para o mês de março. O indicador considerado é o IPC/FIPE entre agosto/2020 até março/2021 que foi de 6,9%. Com isso o valor final da outorga fixa passou a ser de R$ 323.907.000,00.
Conclusão
O ano de 2020 foi devastador para todas as empresas de transporte. Lidar com uma situação como a pandemia de Covid-19 é algo que nem o mais competente administrador poderia prever. Em meio a pol[itica de distanciamento social entra a quase indivisível relação do termo “transporte de massa”. O trem foi feito para carregar muitas pessoas e pensar em uma composição com pessoas apenas sentadas é uma utopia que não poderia ser concretizada nos maiores dos sonhos que se tenha para um sistema metroferroviário como o de São Paulo.
Nesses momentos devemos destacar duas coisas: a primeira delas é o investimento nas obras de modernização, seja da frota ou dos sistemas. A política de prover sistemas de energia mais robustos e sofisticados e sistemas de sinalização mais capazes foi uma das ações que evitou um problema ainda maior com a lotação dos carros em horários de maior movimento. Alguns desses investimentos e obras estão em curso, mérito da CPTM que conseguiu retomar esses contratos. A segunda é o papel do estado como agente social. Apesar do grande prejuízo da CPTM no exercício de 2020, a estatal manteve suas operações e conseguiu, dentro do possível, sustentar a dinâmica dentro da metrópole. Empresas como a CPTM deveriam ser mantidas fortes e não meramente dissolvidas, fato que infelizmente parece ser seu trágico destino.
Reservo esse espaço para parabenizar a categoria dos ferroviários que, na maior crise da nossa historia, não deixaram de seguir em frente, levando vidas e sonhos com responsabilidade. Apesar dos pesares, os benefícios ainda são maiores que as perda financeiras.