Empresa a ser contratada pelo Metrô terá missão de fazer da Linha 20-Rosa um grande negócio

Companhia abriu uma licitação nesta segunda-feira para serviços de aconselhamento financeiro sobre a implantação do ramal metroviário entre a Lapa e Santo André
“Oculus”, a enorme estação no sul da ilha de Manhattan que é um shopping também: exemplo de potencial comercial de sistemas sobre trilhos (Warren LeMay/CC)

O caminho normal para conceber uma nova linha de metrô passa por estudos iniciais de demanda, sondagens do subsolo, mapeamento de terrenos com potencial de serem usados e projetos civis e de sistemas para que seja possível chegar a um panorama mais acertado sobre um empreendimento de mobilidade dessa complexidade. Daí, se seguirmos pelo caminho tradicional, o projeto é fatiado em lotes e licitado.

Outra opção mais recente é usar esse conhecimento para lançar uma licitação mais abrangente, de concessão na modalidade Parceria Público-Privada (PPP) em que o ente privado assume a tarefa de construir e operar a nova linha. Foi o que ocorreu com a Linha 6-Laranja e a Linha 18-Bronze, esta trocada por Doria em 2019 por um corredor de ônibus.

A gestão atual, no entanto, quer encontrar uma forma inédita para viabilizar um projeto dessa magnitude. Como já comentado aqui, o secretário Alexandre Baldy revelou meses atrás que o projeto da Linha 20-Rosa deverá servir como “balão de ensaio” para uma concessão inédita no transporte.

É o que a licitação de “financial advisory” (aconselhamento financeiro) lançada pelo Metrô nesta segunda-feira (19) antecipa. O certame, que tem como data de entrega das propostas o dia 2 de setembro, prevê a contratação de uma empresa ou consórcio que terá como objetivo a avaliação econômico-financeira, análise jurídica/legal, estudo mercadológico e ‘market sounding’ preliminares da Linha 20, segundo descrição do edital.

A grosso modo, essa consultoria terá a missão de transformar a Linha 20-Rosa num negócio com enorme potencial de gerar receitas. Tão atraente que o governo poderia até mesmo ter uma participação muito pequena no investimento necessário.

Traçado da Linha 20-Rosa: estudo mercadológico (CMSP)

O site analisou o edital e comenta a seguir os principais pontos do documento:

A empresa que assumirá o serviço terá 180 dias para produzir os relatórios que nortearão futuros direcionamentos do governo. Eles serão baseados nos estudos já realizados pelo Metrô, a quem a linha está associada no momento.

Duas fases ou fase única

A princípio, a Linha 20 continua dividida em duas fases principais, a prioritária, entre Santa Marina e São Judas, e a fase 2, de São Judas a Santo André. No entanto, um dos objetivos do novo estudo é analisar a possibilidade de uma implantação total do ramal.

Estudo complementar ao projeto funcional e de arquitetura

Vale lembrar que o Metrô já contratou empresas e consórcios para produzirem outras informações sobre a linha, inclusive o projeto funcional e o anteprojeto de arquitetura. Embora esses serviços prevejam o levantamento de custos e aspectos fundamentais como posição das estações, pátio e métodos de escavação, o “Financial Advisory” tem um caráter mais mercadológico e jurídico. Ou seja, servirá como complemento à parte estritamente de engenharia.

Menor impacto financeiro para o poder público

Segundo o edital, o estudo preliminar do Metrô previa a totalidade dos investimentos da obra sendo feito pela iniciativa privada, mas o objetivo nesse caso é apontar uma solução em que o poder público tenha o menor impacto financeiro, seja no subsídio, contraprestação ou aporte de recursos.

Edifício corporativo na avenida Faria Lima poderia ser um exemplo de projeto com estação incorporada (B32)

Revisão dos estudos do Metrô

O primeiro passo a ser feito pela empresa contratada será revisar os dados gerados pelos estudos originais, seja em relação aos prazos de implantação, valor de investimentos, fontes de recursos, previsão de demanda, receitas tarifárias ou não tarifárias e tarifa de remuneração, além de custos operacioais e de manutenção.

Mensurar o reflexo da iniciativa privada nos investimentos

Em seguida, o estudo deverá apontar qual seria o volume de investimentos necessários se o projeto aproveitasse a agilidade e flexibilidade da iniciativa privada. Além disso, propor novas alternativas de captação de recursos e de estrutura de capital da parceria.

Impacto da Covid-19 na demanda

Diante da queda no movimento de passageiros por conta da pandemia, o estudo deverá medir o impacto que a doença pode ter no longo prazo.

Aquisição direta de imóveis

Um dos pontos mais interessantes do edital diz respeito aos imóveis que serão necessários para o empreendimento. Em vez de prever apenas desapropriações, o Metrô incluiu também a aquisição direta de imóveis e propõe que a contratada apresente “soluções inovadoras” de ordem legal e financeira para efetivar os pagamentos.

Uma possível ideia, poderia ser a criação de produtos financeiros como se fossem investimentos a quem se dispor a repassar seus terrenos para o projeto, que foi sugerida por este site anos atrás.

Túnel de metrô: exploração de receita não tarifária é chave para a Linha 20 (GESP)

Descobrir o potencial de receitas não tarifárias do projeto

Talvez o aspecto mais complexo seja avaliar as melhores alternativas para geração de receitas não tarifárias. Segundo o Metrô, a empresa deverá apresentar um estudo mercadológico bastante extenso e que inclua diversas modalidades de exploração comercial, muitas das quais estão hoje em uso, mas nesse caso de forma mais planejada, prevendo o potencial de cada região que será influenciada pela implantação da Linha 20.

A proposta mais desafiadora diz respeito aos empreendimentos associados, projetos de médio e grande porte que poderiam ser erguidos junto das estações e mesmo do pátio de manutenção.

Formas de remuneração

Além desses requisitos, o contrato prevê análises de custo de operação, manutenção, pessoal e de energia elétrica, incluindo a geração por fontes renováveis. A empresa deverá mostrar as vantagens e desvantagens de uma modalidade de remuneração por passageiro transportado ou, então, por oferta de infraestrutura.

Por fim, caberá à contratada identificar potenciais investidores e fontes de financiamento e definir as metodologias de atrações desses atores.

Mais liberdade para gerar receitas

O lançamento da licitação de “financial advisory” é, sem dúvida, uma grande novidade para o setor metroferroviário. Se bem elaborada, essa concessão possui potencial para destravar a expansão sobre trilhos ao finalmente se propor a explorar de forma eficiente toda a enorme cadeia produtiva desencadeada por um projeto desse porte.

Atualmente, a implantação de linhas metroviárias esbarra em dificuldades que em muitos casos podem se tornar vantagens. O exemplo mais claro disso são as desapropriações. Em vez da atitude de confronto, ao desalojar pessoas ou impor uma mudança no entorno, essa nova abordagem pode gerar requalificação, criar empregos, moradias e girar a roda da economia.

Não há dúvida para este site que um dos segredos para que essa proposta vingue esteja em separar claramente as atribuições. O poder público precisa se limitar a definir padrões de serviço, fiscalizar seu cumprimento e ser um beneficiário passivo do potencial de geração de receita. Nada mais que isso.

Se o futuro edital cair na tentação de delimitar a atuação privada no que ela mais sabe fazer pode-se cair numa armadilha jurídica de enormes proporções. Ou seja, cabe ao governo potencializar as oportunidades relacionadas ao negócio, mas deixar o parceiro privado decidir como fazê-lo. O benefício, nesse caso, será de todos.

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15 comments
        1. Explique melhor seu comentário que esta confuso. Qual é relação entre a linha 12 Safira da CPTM, linha 20 Rosa do Metrô e sua incapacidade técnica?
          Nesta questão de incapacidade o que seria e iria propor qual saída para atender a população dos territórios?

    1. tadeu…voces ja tem a linha 12..que esta sendo melhorada….pare de sonhar…rs..e seja realista

    2. Tecnicamente já tem. A Linha 12 – Safira tem trens e estações bem decentes, só peca no intervalo altíssimo, principalmente fora do looping operacional.

  1. Artigo excelente, Ricardo! Você já pensou em reativar o canal no YT do MetroCPTM e dar suas opiniões em vídeo por lá? Seria sensacional.

  2. Enquanto isso nada de metrô em M Boi Mirim, Itapecerica, Anhanguera… As periferias sendo deixadas de lado como sempre.

    1. Santo André Tamanduateí exatos 14 minutos mesmo com a lentidão da curva na dívisa entre santo André São Caetano , qual sentido em fazer uma linha bilionário dessa sendo que a faixa de domínio da linha 10 entre Mauá e Mooca e uma das mais largas que o sistema tem, espaço de sobra só usar criatividade.

  3. Finalmente vamos utilizar o potencial da iniciativa privada para um projeto como este, quem sabe este será o momento de destravar os investimentos e a velocidade de implementação da nossa malha ferroviária !

  4. Com o interesse já manifestado por grupos internacionais, tornar a proposta de PPP mais vantajosa para novas linhas em SP apenas facilita o processo. Como o número de usuários é grande, justifica-se logo de início o investimento. Como o governo de SP já está escaldado da linha laranja, espera-se um processo mais eficiente.

  5. Arrasta um pouco o centro dessa linha rosa para o sul passando no aeroporto de Congonhas (passa muito perto no projeto original). Aí vcs vão ter a demanda para fazer uns 10 shoppings

  6. Os gestores vem protelando e colecionando fracassos com sucessivos erros de planejamento ignorando o “Plano Diretor”, divulgando e iniciando novas linhas de forma concomitante sem concluir as que estão iniciadas, invertendo prioridades, fazendo politicagem com os projetos, desperdiçando o dinheiro público.
    A Linha 20-Rosa que foi utilizada como barganha por causa do monotrilho da Linha 18-Bronze não é mais prioritária.
    Depois de postergadas as Linhas 14-Onix, 18-Bronze, Arco Sul, Metrô de superfície para Linha 10-Turquesa, Trens intercidades para Santos, eis anunciado o cancelamento dos estudos da Linha 20-Rosa no ABC que chegará até só São Judas, desta forma deveremos estar vacinados, e não termos a ilusão que o anunciado se concretizará, pois sua execução e chegada é para o mínimo 15 anos, ou seja, após a década de trinta, lembrando que não existe continuidade e compromissos com isto com relação que o próximo governante que virá após 2022 mesmo sendo do mesmo partido como aconteceu recentemente.
    As próprias declarações recentes de Alckmin confirmaram estas afirmações recentemente.

    1. Alkmin inimigo público número 1 do modal metrô ferroviário do ABC. Toda projeto de Covas e Serra para o ABC primeiro ato de seu governo foi jogar no lixo.

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