Suspensa de participar de licitações do governo do estado até abril de 2021, a construtora paranaense CR Almeida deixou o consórcio que será responsável por um dos lotes da obra de expansão da Linha 2-Verde do Metrô na região da Zona Leste. A novidade é que ela foi substituída por outra empresa do grupo, a CRASA Infraestrutura, aberta em 2014, mesmo ano em que o contrato para a obra foi assinado.
A alteração da composição do então consórcio CR Almeida-Ghella-Consbem foi objeto de um aditivo ao contrato assinado em 27 de setembro com o Metrô. No documento, a CR Almeida foi substituída pela CRASA assim como o nome do consórcio passou a ser CRASA-Ghella-Consbem, que havia vencido a licitação pelo lote nº 2 da obra que levará a Linha 2 até a região de Guarulhos.
O Metrô pagará ao consórcio R$ 1,856 bilhão em valores de 2013 para que execute parte dos túneis e as estações Penha, Penha de França e Penha da CPTM (que atenderá a Linha 11-Coral), entre outras tarefas.
A saída da CR Almeida chama a atenção por um fato: desde abril deste ano o governo Doria aplicou sanções à empresa, que está inidônea até 2021, ou seja, não pode participar de novas licitações no estado. A razão é o abandono das obras da Linha 17-Ouro, na qual integrava o consórcio Monotrilho Integração, composto ainda pela Andrade Gutierrez e pela fabricante de monotrilhos Scomi, da Malásia.
Pela lei 8.666, que regulamenta as licitações no Brasil, a inidoneidade não afeta contratos em vigor, ou seja, como foi assinado em 2014, a participação da CR Almeida em tese não é ilegal. Segundo jurisprudência do TCU (Tribunal de Contas da União), a rescisão imediata de todos os contratos firmados entre as empresas sacionadas com a administração pública nem sempre se mostraria mais vantajosa por motivar a celebração de contratos emergenciais que seriam mais caros e de qualidade geralmente inferior.
Mas essa hipótese cita casos em que outras obras estão sendo executadas dentro da normalidade, algo diferente da Linha 2, cujo início só deverá ocorrer em 2020.
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Precedente perigoso
O site consultou o Dr. Ariosto Mila Peixoto, advogado que atua em direito público, compliance e direito penal, e que manifestou preocupações com esse caso específico. “A sanção administrativa foi aplicada pelo próprio órgão contratante com o qual a empresa mantém o contrato sob análise, o que recomendaria, na minha opinião, uma análise mais acurada para não transparecer uma possível vantagem à empresa que teria sido punida pela sua inexecução e, portanto, prejuízo à Administração, no âmbito do mesmo órgão contratante”, afirmou.
Sobre a mudança da composição societária, há precedente para alterá-lo em situações como a modificação do percentual de participação de cada empresa, exclusão de uma delas por motivos de punição ou falta de recursos finaceiros, por exemplo. Mas a regra, segundo o advogado, é a “imutabilidade dos consórcios”.
“No caso em apreço, entendo que a substituição de uma consorciada por uma outra empresa que sequer participou da licitação, abre precedente perigoso para violação a antigos conceitos previstos na legislação e na jurisprudência, tais como:
a) admitir ao contrato empresa terceira, que sequer participou da licitação, a violar o princípio da isonomia bem como o princípio da obrigatoriedade de procedimento licitatório;
b) cessão de parte substancial do contrato, sem autorização prevista em lei;
c) substituir uma empresa por outra pertencente ao mesmo grupo econômico, a caracterizar possível tentativa de evitar os efeitos da penalidade aplicada à primeira, atraindo para o caso o instituto da ‘desconsideração da personalidade jurídica’;
d) sob análise contábil, é vedada a emissão de nota de empenho a CNPJ diferente daquele registrado no sistema (das vencedoras da licitação), exceto no caso de subcontratação”.
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O que o Metrô disse sobre o assunto
O site questionou o Metrô sobre a alteração do contrato e obteve a seguinte resposta:
“Houve uma cisão parcial da empresa CR Almeida que solicitou a substituição desta no Consórcio pela empresa CRASA INFRAESTRUTURA S/A. Ao Metrô coube a análise acerca da manutenção dos requisitos de habilitação estabelecidos no Edital de Pré-qualificação da Concorrência, não somente em relação à empresa CRASA como das demais integrantes do Consórcio. Foi constatado que a nova configuração atende aos requisitos de habilitação técnica, financeira e jurídica previstos no Edital, não trazendo prejuízos à execução do contrato”.
Tentamos contato com a CR Almeida mas até o momento da publicação deste artigo não tivemos retorno da empresa.
A opinião do site
Em que pese a situação parecer normal, a mudança de uma empresa com o CNPJ bloqueado por outra que pode celebrar contratos com o governo do estado demonstra que a lei não tem efeito prático na vida real. Pelo desinteresse que a CR Almeida (e também Andrade Gutierrez e Scomi) demonstrou em relação ao contrato de construção do monotrilho, com inúmeras interrupções e desmobilizações de canteiros, sem falar nos pedidos de compensações finaceiras pela obra, a empresa não poderia continuar à frente de nenhum outro projeto no estado, muito menos um de tão grande complexidade como a Linha 2-Verde.
Pelo fato de que a obra em si não começou seria sensato que ela fosse excluída do consórcio e não apenas substituída por outro CNPJ do mesmo grupo, o que mostra que não é difícil driblar as punições administrativas que a gestão pública tem em suas mãos. Os motivos reais que fizeram o grupo pedir a alteração no contrato talvez nunca sejam conhecidos, porém, soa estranho que tenham decidido tirar uma empresa inidônea de cena às vésperas da retomada de uma obra vistosa como essa e que custará ao menos R$ 5,5 bilhões aos cofres públicos.
![Pátio Água Espraiada: trabalhos começaram mas obras, apenas em outubro](https://www.metrocptm.com.br/wp-content/uploads/2016/09/patio-agua-espraiada2-0916-750x500.jpg)