Parecer técnico do MP não traz novidades sobre causas do incidente com o monotrilho

Relatório do Ministério Público, baseado em documentos dos próprios envolvidos, chega à conclusão óbvia que o consórcio CEML é o culpado pela falha no equipamento run-flat, motivo da paralisação da Linha 15-Prata em fevereiro do ano passado
Monotrilho da Linha 15 (CMSP)

Nesta terça-feira (5), a TV Globo e o site G1 causaram alarde com a divulgação de um parecer técnico do Ministério Público de São Paulo concluído em 31 de agosto e que aborda o incidente na Linha 15-Prata em fevereiro de 2020 que culminou com o rompimento de um pneu e a queda de partes do equipamento ‘run-flat’.

O documento, de 27 folhas, foi produzido pelo núcleo de engenharia da instituição com base na análise de documentos técnicos fornecidos pelo Metrô de São Paulo e pelo consórcio CEML, responsável pela construção das vias do ramal, dos sistemas e trens – nesse caso a cargo da Bombardier, empresa canadense hoje encampada pela Alstom.

A despeito do tom sensacionalista das reportagens, a conclusão do Ministério Público é óbvia e conhecida: falhas no projeto do Innovia 300, trem de monotrilho da Bombardier, e na execução das obras civis.

Vigas-trilho: 192 pontos reparados

A combinação de vias com diversas irregularidades, somadas ao sistema run-flat com uma margem pequena de distância da superfície interna dos pneus fizeram com que houvesse um desgaste prematuro na composição M20, que acabou apresentando um rompimento e consequente quebra da peça metálica – lançada na avenida abaixo da via.

Diante do exposto, conclui-se que a Linha 15 – Prata possuía problemas de projeto e execução nas obras civis que levaram a irregularidades na via-guia, bem como, problemas de projeto e fabricação e montagem dos trens e seus componentes, resultando em interferência entre o run flat e superfície interna da banda de rodagem dos pneus, sendo a combinação destes dois fatores a causa do estouro do pneu da composição M20,” afirmam os engenheiros do MP.

Como o fornecimento do material rodante e da infraestrutura civil estava contratualmente a cargo do CEML – Consórcio Expresso Monotrilho Leste, constituído pelas empresas: Construtora Queiroz Galvão S/A (líder do Consórcio), Construtora OAS Ltda., Bombardier Transit Corporation e Bombardier Transportation Brasil Ltda., entende-se serem estas as responsáveis pelas irregularidades encontradas no Sistema Monotrilho“, aponta o laudo.

As causas do incidente foram apontadas pela própria Bombardier

A constatação dos problemas aparece no relatório como feita pela própria Bombardier e o CEML que atuaram para reduzir o diâmetro da peça e também corrigiram a superfície das vigas-trilho em 192 áreas da via. As empresas também determinaram inspeções em partes que não estavam em conformidade com o projeto e outras medidas de segurança.

A Linha 15-Prata voltou a funcionar em junho do ano passado e desde então não houve mais problemas do gênero.

Consultado pela TV Globo, o Metrô afirmou ter multado as empresas do consórcio. A companhia chegou a encomendar um laudo independente para o IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicos), mas o relatório não foi tornado público até hoje. O site tentou obter uma cópia do documento por meio da Lei de Acesso à Informação, mas teve o pedido recusado por tratar-se de informações sigilosas, segundo o governo Doria.

As ações tomadas pelo consórcio: ‘confissão de culpa’ em relação ao problema

Assuntos não relacionados

O relatório do Ministério Público foi feito a pedido do promotor Silvio Marques, que abriu um inquérito em março de 2020, logo após o fechamento do ramal ao público a pedido da Bombardier.

Além de abordar o problema do ‘run-flat’, o inquérito também inclui outros problemas não relacionados com o incidente, como o choque entre dois trens, considerado pelo Metrô como uma falha humana, e a abertura das portas de um monotrilho após deixar uma estação.

Ambos envolvem o sistema de controle de trens e portas de plataforma e não são atrelados especificamente ao modal de monotrilho – a própria Bombardier utiliza tecnologia semelhante na Linha 5-Lilás, de metrô convencional.

Diagrama mostra a pequena margem de distância entre o run-flat e o pneu

As informações trazidas pelo laudo têm ao menos um ponto positivo, que é o de trazer clareza maior para o assunto, dada a falta de transparência da atual gestão sobre o assunto.

Entre os documentos analisados, um chama a atenção por explicar a margem de segurança que o run-flat possuía em relação à banda de rodagem, de apenas 6 milímetros.

O Innovia 300, modelo de trem de monotrilho em uso na Linha 15-Prata, era um estreante em 2014. A Bombardier já havia fornecidos sistemas semelhantes como em Las Vegas, mas com uma geração diferente de material rodante. Hoje, o monotrilho pertencente à Alstom está sendo implantado no Egito e em Taiwan, um sinal de que, apesar dos problemas, trata-se de uma tecnologia válida.

Trem de monotrilho idêntico ao usado na Linha 15 e entregue no Egito meses atrás (Alstom)

No entanto, é preciso ir a fundo na investigação relacionada à execução da Linha 15, esta sim, cheia de percalços e problemas. A oscilação do trem sobre as vias causa estranheza neste site desde o primeiro contato com ele, há sete anos. Esse comportamento não é visto em outros sistemas mundo afora, por isso não surpreendeu que a má qualidade das superfícies das vigas-trilho tenham contribuído para o incidente.

O que não se pode, mais uma vez, é jogar a culpa no modal, como tem sido recorrente. Seria o mesmo que considerar o incêndio num ônibus em São Paulo ocorrido nesta semana como motivo para invalidar toda a rede sob pneus da capital paulista.

Ônibus a serviço da SPTrans pega fogo após curto-circuito: problema isolado não causou paralisação no serviço na capital paulista. Será que a atitude seria a mesma com o monotrilho? (Reprodução)

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  1. MP entende tanto de metrô quanto eu de astrofísica, palpitam em tudo. E a grande imprensa é porta-voz desse pessoal não é de hoje, só replicam, não questionam nada.

  2. Ótima reportagem explicativa, pois se está construindo e expandindo uma das múltiplas linhas incompletas e inacabadas porém gostaria que se possível fosse feita por este blog Metrô CPTM, quais foram as conclusões do laudo independente do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas) que foi contratado por ser um organismo altamente qualificado para uma avaliação dos acontecidos no ano passado por ocasião do incidente após 111 dias paralisados sem atender a região, a Linha 15-Prata retomou a operação nas estações Sapopemba, Fazenda da Juta e São Mateus dia 18 de junho de 2020, passados mais de ano e meio do seu retorno aparentemente resolvido, embora ainda não esteja funcionando a plena carga. Quem bancou este prejuízo desta longa paralisação? De quanto foi o custo?
    Da mesma forma como e quanto foram os gastos e prejuízos financeiros com o PAESE e quantas intervenções houveram nos últimos cinco anos por ocasião das paralisações não programadas do sistema Metrô / CPTM, por conta das múltiplas paralisações não programadas.
    Estas informações são importantíssimas para se poder avaliar o desempenho destes sistemas.

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