A Secretaria dos Transportes Metropolitanos, sob gestão de Alexandre Baldy, enviou esclarecimentos ao site a respeito da matéria “Corredor de ônibus que substituirá a Linha 18-Bronze muda traçado e vê estimativa de custo aumentar“, publicada na quinta-feira (12) e que comentava as informações divulgadas após a reunião com o Consórcio Intermunicipal do ABC a respeito dos planos de mobilidade que a gestão Doria anunciou em julho para a região.
O órgão questiona as afirmações deste site e considera equivocado o uso da expressão “corredor de ônibus” utilizada no artigo, entre outros assuntos. Confira a seguir as ponderações do governo e nossos comentários a respeito:
STM: “A expressão ‘Corredor de ônibus’ é equivocada, visto que será implantado um BRT (Bus Rapid Transit), que possui uma série de qualidades que o diferencia dos corredores”.
Na opinião deste site, BRT é apenas um eufemismo para um corredor de ônibus com características expressas. O que o governo anunciou como solução de transporte no lugar da Linha 18-Bronze de metrô não deixa de ser um corredor de ônibus segregado, com promessas de faixas de ultrapassagens e cobrança antecipada de tarifa. Chamar pontos de ônibus de “estações” é mais um exemplo desse eufemismo, para dar ar de novidade e qualidade a uma estrutura que se resume a uma plataforma no nível de embarque e com área fechada em alguns casos.
Sobre o termo BRT (Bus Rapid Transit em inglês e que traduzido de forma literal seria algo como “metrô de ônibus”), vale dizer que não existe um consenso sobre o que se encaixa nessa definição. O Departamento de Transportes dos Estados Unidos, por exemplo, o define como ” um sistema de trânsito baseado em ônibus de alta qualidade que oferece serviços rápidos e eficientes, que podem incluir faixas dedicadas, vias de ônibus, prioridade de sinal de trânsito, cobrança de tarifa externa, plataformas elevadas e estações aprimoradas”. De fato, há vários casos de “BRT” mundo afora em que nem mesmo há pistas exclusivas para a circulação desses ônibus.
Em suma, o projeto em questão não deixa de ser um corredor de ônibus na prática, mas com aprimoramentos para funcionar de forma mais eficiente.
STM: “A afirmação de que a solução de mobilidade ‘substituirá a Linha 18-Bronze’ também está incorreta, pois o plano de mobilidade apresentado é uma solução desenhada pela gestão atual para a região do ABC, que atende de forma adequada à demanda do ponto de vista de conforto, tempo de viagem e segurança”.
Novamente discordamos. A tal solução de mobilidade percorrerá um traçado semelhante ao monotrilho e terá uma função parecida, criar um acesso mais rápido às linhas 2-Verde do Metrô, e 10-Turquesa da CPTM, caso não surjam mudanças de traçado. A Secretaria se apoia em dados misteriosos para afirmar que o plano de mobilidade atenderá à demanda, mas até hoje não foram divulgados quaisquer estudos que apontem para a suposta redução no movimento de passageiros esperado para a Linha 18, ao contrário de levantamentos da gestão anterior e que são públicos.
Afirmar também que a readequação de uma linha de trens metropolitanos, cuja promessa é antiga, e prometer uma linha de metrô pesado que tem horizonte extremamente distante como parte da solução que substituiu um projeto pronto para ser iniciado é um evidente exagero. A Linha 20-Rosa, aliás, tem uma função bem diferente de melhorar a mobilidade no sentido da Zona Sul de São Paulo, hoje atendida pelo Corredor ABD, operado pela concessionária Metra e que chega à estação Jabaquara e também à região da avenida Engenheiro Luis Carlos Berrini.
STM: “Quando a matéria diz que as obras ‘durarão seis meses a mais que o previsto’ e ‘tempo estimado da obra é de dois anos e não mais 18 meses’, ressaltamos que todos os prazos já apresentados são estimados. O prazo final só será apresentado quando o projeto básico for contratado e entregue ao Governo. Lembramos que será preciso fazer uma nova integração no Terminal e na Estação Sacomã, que hoje já estão em operação.”
Em julho, durante a coletiva do governador João Doria, esses argumentos foram usados à exaustão, sem falar em declarações anteriores quando a mudança ainda não havia sido confirmada, apesar de vários rumores apontarem para o fim do monotrilho. Em resumo, o governo do estado justificou a decisão de cancelar a Linha 18 de metrô, que seria cara, por um sistema muito mais barato e rápido de construir, citando que o tempo de implatanção seria de 18 meses. À medida que o tempo passa, essa estimativa cresceu e deve se ampliar ainda mais pelo histórico das obras públicas desse gênero no Brasil. Ignorar esse fato é ingenuidade. Mesmo com o projeto básico pronto é esperado que o prazo seja muito maior para um modal que está partindo praticamente do zero.
STM: “Vale reforçar que o documento citado na matéria e atribuído à Secretaria dos Transportes Metropolitanos (STM) não é reconhecido por esta pasta.”
A referida apresentação em nenhum momento é fonte das informações atribuídas ao governo do estado, mas suas coincidências e previsões, sim, como a opção de um trajeto até a estação Sacomã.

STM: “Sobre os custos ‘26% superiores’ citados na matéria, de ‘R$ 860 milhões’, esclarecemos que se deve ao fato da previsão de construção de mais duas estações além das que eram previstas inicialmente e da ampliação do trajeto em dois quilômetros.”
Mais uma vez, a contradição veio do governo que estimou os custos da obra em R$ 680 milhões em julho como argumento para justificar a mudança. Sobre a ampliação do projeto, publicamos erroneamente que seria uma troca e depois a corrigimos – infelizmente, a Secretaria não divulgou nota oficial sobre a reunião. Apesar disso, houve sim um aumento na previsão de custos, não importa se isso foi causado pela ampliação do trajeto afinal o objetivo continua o mesmo, oferecer um meio de transporte coletivo de alta eficiência para ligar o ABC à capital paulista.
Vale lembrar que o principal argumento do governo Doria para cancelar a linha de monotrilho foi o custo elevado, citado como de R$ 6 bilhões, mas nunca esclarecido devidamente a ponto de explicar que ao poder público caberia um valor aproximado de R$ 2,5 bilhões. Portanto, a solução alternativa de mobilidade deve sim ser comparada pelo seu custo e futuramente pelo seu benefício para a população.
STM: “Quanto à análise feita sobre tempo de duração da obra, no trecho em que diz que ‘é praticamente a mesma época em que o monotrilho da Linha 18-Bronze seria concluído, segundo a VEM ABC, caso tivesse luz verde do governo em julho e pretendia começar a operá-lo no final de 2022’, esclarecemos que a comparação não é válida, pois são duas construções distintas de complexidades diferentes. A exemplo, podemos citar o tempo de implementação das linhas 15-Prata e 17-Ouro do Monotrilho.”
O ABC Paulista esperou anos pela Linha 18-Bronze e que foi promessa do então candidato João Doria. Mas já no cargo, o governador descumpriu essa promessa e apostou em um projeto rodoviarista para uma região cujo viário já é caótico. A alegação de que o “BRT” será entregue em um prazo menor deve ser conferida por este site e relatada aos leitores. As datas citadas foram divulgadas pela própria gestão e a afirmação de que o monotrilho poderia ficar pronto no final de 2022 ou no máximo no começo de 2023 partiu da VEM ABC. Em ambos os casos, são previsões cujos detalhes não temos acesso.
Ainda assim, a população do ABC Paulista precisa saber quando o “BRT” ficará pronto e se houve de fato a prometida “rapidez” em relação ao monotrilho. Tudo leva a crer que isso não ocorrerá por uma simples razão: embora seja menos complexo, o corredor está num estágio inicial enquanto o monotrilho possuía projetos, estudos e, sobretudo, um contrato em vigor, embora por excentricidades jurídicas, ele não estivesse “ativo” – apesar de a concessionária existir e ter trabalhado para implantá-lo nesses cinco anos desde sua assinatura.
Infelizmente, a atual gestão de governo parece não entender ou ignorar que o planejamento de mobilidade de uma região como a Grande São Paulo requer continuidade e não rupturas como o troca de um modal sob trilhos por ônibus. A demanda por transporte público de qualidade é imensa e ela não é encontrada nos ônibus, como mostram estatísticas recentes que denunciam uma redução no uso desse modal. Trens, ao contrário, têm demanda crescente além de estimularem a requalificação do entorno.
Uma das explicações está no fato de que os ônibus têm sido ineficientes quando tentam substituir metrôs e trens em meio à malha urbana. O BRT surgiu como uma forma de driblar essas fraquezas ao priorizar o ônibus perante outros veículos, mas não há milagre, como se vê em Curitiba, cidade que deu origem ao conceito e que sofre com congestionamentos e queda no número de passageiros. Em vias estreitas como as de São Paulo e no próprio ABC quem paga o pato são pedestres, que perdem calçadas, imóveis desapropriados e a qualidade de vida diante do intenso tráfego de veículos pesados que circulam por suas avenidas. Basta ver a precariedade de uma avenida Santo Amaro ou de trechos do próprio corredor ABD.
O ônibus tem de ser usado na sua função ideal, como alimentadora da rede metroferroviária, esta sim, prioridade absoluta não só em São Paulo como em várias outras cidades brasileiras. O resto é querer tapar o sol com a peneira.
