Reza a lenda que os governantes “programam” as principais inaugurações de obras para os anos em que ocorrem eleições, como forma de explorar a imagem positiva gerada por elas em suas campanhas.
Apesar de haver uma concentração de eventos do gênero nesses períodos, parece bastante difícil que a classe política consiga tamanha organização e controle a ponto de direcionar esses projetos para que possam servir como vitrines eleitorais para candidaturas.
O que é mais crível é aproveitar projetos cuja janela de estreia coincida com o calendário eleitoral e correr apenas com o necessário para que seja possível viabilizar uma operação mínima. Um exemplo repetido aqui é o do início de 2018, quando o ex-governador Geraldo Alckmin realizou diversas inaugurações na malha metroferroviária de forma apressada, como ocorreu na Linha 13-Jade da CPTM e na extensão da Linha 15-Prata, ambas funcionando inicialmente de forma precária.
Alckmin visava beneficiar-se da maior expansão sobre trilhos da história de São Paulo para viabilizar seu nome como presidencial, mas o efeito foi praticamente nulo naquele ano.
Pois às vésperas de outra eleição majoritária no país, em 2022, o que podemos esperar em relação ao Metrô e à CPTM? Se depender dos prognósticos do governador João Doria e do secretário dos Transportes Metropolitanos, Alexandre Baldy, dois projetos estarão prontos no ano que vem.

O primeiro deles é a estação Varginha, da extensão sul da Linha 9-Esmeralda. A despeito do enorme atraso que ela enfrenta, a atual gestão continua anunciando 2022 como data de abertura. De fato, o movimento no canteiro de obras está bem maior do que nunca, como mostra um vídeo recente do canal iTechdrones.
Uma via provisória estava sendo construída para permitir o desvio da avenida que passa em frente à estação. Com isso será possível construir ali um viaduto que possibilitará separar o tráfego de veículos dos trilhos do ramal.
O corpo principal da estação também ganhou mais concreto e mesmo duas escadas fixas. Passarelas que a ligarão aos prédios de apoio também começaram a ser construídos, além de outros trabalhos menores. As vias até Mendes-Vila Natal voltaram a ter alguma atividade, mas ainda assim parece excesso de otimismo que a CPTM consiga cumprir a promessa em menos de 16 meses.

Sem sinal dos trens
A outra aposta da gestão Doria é acabar com a novela da Linha 17-Ouro. O ramal de monotrilho completará 10 anos em obras em abril do ano que vem e continua ainda longe do estágio que um projeto precisaria estar para realizar algum tipo de teste geral em no máximo um ano.
Depois de várias atribulações na Justiça, o Metrô conseguiu executar os dois contratos principais, um de obras civis e outro de sistemas.
O primeiro foi vencido pela empresa Coesa, pertencente à OAS, mas desde o começo do semestre a construtora passou a fazer parte do Consórcio Monotrilho Ouro, que inclui a KPE, uma empresa de engenharia que assumiu as antigas obras da construtora baiana como a ponte Octávio Frias.
Após isso, os trabalhos, que eram lentos, passaram a ganhar algum ritmo. Neste mês, espera-se o início do lançamento de vigas-trilho e até o final do ano as estruturas metálicas faltantes devem começar a ser entregues pelos fornecedores.
Novamente soa difícil acreditar que todas as sete estações e o pátio, além de vias, ficarão prontos até o final do ano que vem. Mas há tempo para recuperar terreno e viabilizar essa previsão.

O problema da Linha 17, no entanto, está no contrato de sistemas, que inclui os 14 trens de monotrilho que, espera-se, estão sendo fabricados pela chinesa BYD SkyRail. A fabricante também fornecerá vários outros sistemas e é nela que reside a grande dúvida sobre o prazo.
Não é só: há um contrato de fornecimento de energia que mal avançou até aqui e a sombra do processo na Justiça movido pela Signalling, consórcio que questiona o resultado da licitação. Por fim, a própria BYD teve pouco meses desde que retomou o direito de assumir o projeto de forma provisória.
Pensar que teremos um trem rodando mesmo que em parte da linha no prazo de pouco mais de um ano é realmente uma visão surreal. Ainda mais porque se trata de um sistema totalmente novo e que exige horas e mais horas de testes antes de apresentar condições de receber passageiros.
O governo ensaia uma inauguração parcial, mas até isso só vendo para crer.

Pretensões eleitorais
Por falar em ver para crer, resta saber se Doria e Baldy estarão em seus cargos até o final de 2022 para cumprirem a promessa ou serem cobrados em uma eventual frustração. Ambos, no entanto, são fortemente cogitados pela grande imprensa como candidatos na próxima eleição.
O governador, como se sabe, se lançou como pré-canditado à presidente do Brasil pelo PSDB, mas depende que seu nome seja confirmado nas primárias do partido em novembro. Já o secretário dos Transportes Metropolitanos, é apontado como potencial candidato ao Senado por Goiás pelo PP, partido ao qual preside no estado.
Em ambos os casos, a confirmação das candidaturas significará a descompatibilização com seus cargos até abril do ano que vem, época em que nem Varginha, muito menos a Linha 17 estarão perto de pretensa inauguração.