Tribunal de Contas vê diversas suspeitas de irregularidades no contrato da Metra que incluiu o BRT ABC

Projeção do corredor BRT (GESP)

A despeito de negar provisoriamente a suspensão do contrato renovado entre o governo Doria e a concessionária Metra, a decisão do Tribunal de Contas do Estado divulgada nesta semana revela fatos preocupantes.

O conselheiro-substituto Valdenir Polizeli, que analisou um pedido de sustação cautelar do contrato (ou seja, que ele fosse suspenso até análise do mérito), listou várias suspeitas de irregularidades não só da renovação em si, que estendeu a duração do contrato para mais 25 anos e acrescentou serviços não previstos, como também da existência de um montante apontado em R$ 738,6 milhões devido pelo governo do estado à Metra.

“Ao menos em tese, novos investimentos em sistemas ‘Bus Rapid Transit – BRT’, bem como a incorporação de conjunto de linhas municipais advindas de novo modelo de transporte, são todos quesitos de investimentos plenamente aplicáveis numa licitação para novo contrato de concessão nos moldes do que dispõe a Lei 8.987/95″, afirmou Polizeli.

“Digo isso porque visualizo alguns alguns sinais aparentes de que o uso da Lei Estadual 16.933 de 2019 e a instauração do procedimento administrativo de prorrogação antecipada tiveram como causa primordial os aludidos cálculos de apuração do passivo de R$ 738,6 milhões em favor da atual Concessionária, de sorte que sua diluição ao longo do fluxo de caixa desse novo prazo de 25 (vinte e cinco) anos parece ter sido a solução posta como alternativa à sua incorporação na dívida consolidada do Estado de São Paulo”, pontificou.

O conselheiro então estranhou o fato de que o contrato de cessão da EMTU com a Metra tenha gerado uma dívida tão grande. “Um ponto de atenção extraído desse quadro advém da premissa de que não se pode esperar expressivos aumentos da dívida do Poder Público como resultado esperado e natural de toda concessão de serviços públicos. A existência de passivo em tal monta, que se agrega, ainda que indiretamente, à dívida estatal, constitui sinal relevante de sérias desconformidades na execução e regulação do Contrato de Concessão EMTU/SP nº 20/1997″, observou.

Politizeli então concluiu: “E não obstante tal implicação advinda do passivo apurado e a expressividade do seu impacto, ainda que indireto, no endividamento do Estado, não há nos
documentos juntados aos autos pelas partes interessadas algum sinal de que os cálculos da apuração desse passivo de R$ 738,6 milhões tenham sido submetidos a uma instância reguladora
para revisão e validação das memórias de cálculo, premissas e resultados”.

“Ressalve-se que isso é extraído de uma observação sumária e preliminar da matéria”, escreveu o relator.

Acordo entre o governo Doria e a Metra continuam sendo analisados na Justiça comum e no Tribunal de Contas do Estado (GESP)

Novo contrato sem licitação

Polizeli então aborda os pontos que fizeram o governo Doria tentar enquadrar a ampliação e mudança do escopo com a Metra para parecer como uma simples renovação de um contrato.

“Sob outro aspecto, não há como deixar de observar que as cláusulas do Termo Aditivo nº 13/2021 de 23/3/2021 e de seus anexos não revelam um instrumento com características de um termo aditivo e modificativo. É que tais cláusulas mostram um instrumento com características de um contrato novo para a concessão de serviços públicos“, notou o conselheiro.

Valdenir Polizeli vê a necessidade de uma análise mais profunda sobre essa estratégia: “E num termo aditivo com características aparentes de contrato novo, não há como deixar de sopesar a necessidade de um aprofundamento na análise de algum eventual ponto de contato da matéria com os comandos do art. 175 da Carta Magna e do art. 14 da Lei 8.987/97, numa reflexão de que, ao menos em tese, uma eventual intenção de criar nova hipótese de dispensa de licitação ou de inexigibilidade de licitação esbarraria no art. 22, XXVII, da Lei Maior“.

Por fim, o conselheiro estranha a ausência de revisão e validação dos termos que foram celebrados no aditivo assinado em abril e que definiram as formas de receitas da concessionárias e sua taxa de retorno no projeto.

“A respeito desse novo prazo de 25 (vinte e cinco) anos, que se soma aos 25 (vinte e cinco) anos originários do Contrato de Concessão EMTU/SP nº 20/1997, ainda que se possa argumentar que a Lei 8.987/95 construa um sistema no qual o prazo de vigência é moldado pelo fluxo de caixa de amortização e remuneração pela taxa de retorno do empreendimento, não me parece haver no procedimento administrativo aqui juntado algum sinal de que as memórias de cálculo e premissas desse novo fluxo de caixa tenham sido submetidas a uma instância reguladora para revisão e validação. Penso nessa instância reguladora ao considerar os efeitos, ainda que indiretos, da assunção dessas novas obrigações à gestão da dívida do Estado de São Paulo”.

O conselheiro Polizeli, no entanto, seguiu o entendimento da 2ª instância, em recente decisão, de não barrar a execução do contrato enquanto são analisados os aspectos do processo no TCE. Ou seja, a visão aqui é que cabe ao governo do estado a presunção de que está seguindo a lei até prova o contrário.

O que, obviamente, não significa que o controvertido episódio da troca da Linha 18-Bronze do Metrô por um pacotão de benefícios à Metra tenha sido legal. É isso que tanto a Justiça comum quanto o Tribunal de Contas continuam a investigar, como determinou Polizeli:

“Todo esse cenário, portanto, enseja o recebimento da matéria como representação de rito ordinário nos termos do art. 214 do RITCESP, com abertura de vista dos autos à Procuradoria da Fazenda do Estado e ao Ministério Público de Contas, e posterior remessa à Diretoria de Fiscalização competente para instrução da matéria”.

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