A polêmica do “Shopping Trem” no Metrô e CPTM

Ambulante na Linha 8 da CPTM

O roteiro já é conhecido por quase todos os passageiros principalmente das linhas da CPTM. Basta fechar as portas da composição para que o “Shopping Trem” comece a funcionar. O apelido, dado pelos próprios ambulantes, é uma das muitas frases de efeito usadas pelos vendedores informais que inundam os trens tanto do Metrô quanto da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos.

O fenômeno, no entanto, varia de intensidade. Se é mais raro em algumas linhas do Metrô e da CPTM ele é realizado de forma descarada em outros ramais como a Linha 12 e a Linha 8. Trens com passagem livre entre os vagões são os preferidos porque permitem que o ambulante se desloque sem dificuldade por eles, mas isso não é problema nos trens da Série 2000. Mesmo com portas entre os carros, esses vendedores já conseguiram abri-las sem que isso provoque algum tipo de reação da empresa.

Mas ao menos em uma linha o “mercado” encolheu para o comercial ilegal. Prestes a ser assumida pela Via Mobilidade, concessionária privada que passará a operá-la no dia 4 de agosto, a Linha 5-Lilás já não é mais um dos locais de trabalho preferidos de marreteiros. O site circulou pela linha nesta semana e notou apenas um ambulante e atuando de forma mais discreta.

A razão para isso é a presença de inúmeros seguranças da empresa, “irmã” da Via Quatro, operadora da Linha 4-Amarela e onde o comércio ambulante é raro. Mas afinal por que essa atividade informal é tolerada pelo governo e combatida pelo operador privado? Por que mesmo com a polícia ferroviária e seguranças terceirizados a CPTM não consegue o mesmo resultado? Ou o Metrô e seus respeitados seguranças de preto idem?

Uma frase dita por Clodoaldo Pelissioni, secretário dos Transportes Metropolitanos, em entrevista recente ao site explica bastante. Perguntado sobre o problema, Pelissioni se resumiu a responder ser “um problema social”. Ou seja, impedir isso, embora seja uma atividade ilegal, não faria bem para a imagem do governo afinal estamos num período de crise econômica com milhões de desempregados.

Já para empresas privadas trata-se de competição comercial. Se deixar que o comércio ambulante prospere a Via Quatro estará prejudicando seus clientes, as lojas e lanchonetes estabelecidas nas estações.

Preço de aeroporto

No meio disso temos os passageiros que naturalmente consomem e bem os itens oferecidos pelos marreteiros. Chocolates, fones de ouvido e outros produtos têm preços bem mais baixos do que em lojas que pagam impostos criando um argumento de venda irrecusável. Para completar, para muita gente o ambulante é um trabalhador desempregado que ao menos está procurando uma saída para sobreviver.

O problema nessa visão simplista é que o mercado informal é na realidade extremamente atraente comparado a um emprego de baixa qualificação mesmo dentro da CLT. Basta uma conta simples para constatar que nem é preciso muito trabalho para gerar uma receita considerável. Pegue-se o exemplo de um chocolate qualquer vendido a R$ 2,00 num trem e que pode custar para o ambulante no máximo R$ 0,60 em uma loja de atacado. Que nosso vendedor hipotético ganhe líquido R$ 1 por unidade vendida, já considerados alguns “custos”. Se ele passar 5 minutos em um vagão e venda duas unidades são R$ 2,00, que vezes 12 chega-se a R$ 24,00 por hora. Digamos que ele só trabalhe seis horas por dia então teremos R$ 144 ao final do seu expediente. Vendendo apenas nos dias úteis ele terá conseguido uma receita líquida de R$ 3.168,00 ou 332% a mais que o salário mínimo.

Seguranças da Via Mobilidade já inibiram a presença de vendedores do “Shopping Trem” na Linha 5-Lilás

Seria fabuloso se esse indivíduo não deixasse de pagar impostos e recolher sua contribuição previdenciária como trabalhadores registrados e empresas fazem. E aqui estamos imaginando ingenuamente que essas iniciativas são pessoais e não orquestradas por grupos organizados. Aí então o problema é ainda mais grave.

No entanto, o outro lado da moeda, as lojas autorizadas a vender nesses recintos, também não são um bom exemplo. Vamos agora imaginar um passageiro consciente, que prefere não alimentar o comércio ambulante e opta por consumir “oficialmente” nas dependências das estações. Pois se ele comprar uma garrafa de água num dos quiosques da estação Pinheiros da Linha 4 poderá pagar nada menos que R$ 4,00. Sim, preço digno de aeroporto, onde os valores são conhecidamente exagerados. O mesmo produto num desses mercados de bairro sai por no máximo R$ 1,50, ou seja, 63% mais barato.

Bom senso

Como se vê, não se trata apenas de um “problema social” como acredita o governo, e sim de uma questão puramente mercadológica. Existe uma enorme demanda por produtos e serviços dentro da rede metroferroviária afinal estamos falando de milhões de pessoas que passam algum tempo do seu dia circulando por ela. Oferecer uma solução para elas é mandatório, mas isso não significa cobrar absurdos afinal essa estratégia só vai alimentar a outra ponta, o comércio informal.

O melhor seria que o governo concedesse a exploração comercial das estações como um todo para grupos maiores, capazes de negociar de forma mais forte por produtos com fornecedores, assim como fazem os supermercados. Com uma estratégia assim seria possível oferecer preços realistas o que eliminaria a “vantagem” do comércio informal. Passageiros sairiam ganhando e o governo e empresas também sem falar na arrecadação de impostos. Quem sabe assim o “Shopping Trem” possa funcionar mesmo com as portas do trem abertas.

Veja também: Concessão da Linha 15-Prata é remarcada para 31 de julho

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