Contrato de R$ 342 milhões para montagem das portas de plataforma do Metrô inclui empresa que nunca prestou serviços

Consórcio Kobra tem como um dos sócios a MG Engenharia e Construção, fundada há menos de um ano por dois ex-diretores da OAS, um deles denunciado pelo Ministério Público
Portas de plataforma (Woori)

O Metrô de São Paulo homologou nesta quarta-feira (05) o contrato para fornecimento e montagem das portas de plataforma que serão instaladas na maior parte das estações das linhas 1-Azul, 2-Verde e 3-Vermelha. O vencedor do certame foi o consórcio Kobra, formado pelas empresas sul-coreanas Samjung Tech, Woori Technologies, a Husk Eletrometalúrgica, do interior de São Paulo, e a MG Engenharia e Construção Ltda, que pediu R$ 342 milhões na licitação, segundo menor preço, mas que foi escolhido após a desclassificação do consórcio PSD (R$ 316 milhões).

É justamente a MG Engenharia que chama a atenção na sociedade. A empresa foi aberta em junho de 2018, portanto há menos de um ano, por dois ex-diretores da construtora OAS, uma das principais empresas envolvidas na Lava Jato. Embora isso não ateste qualquer culpa a seus ex-funcionários, um dos sócios, Francisco Germano Batista da Silva, foi denunciado pelo Ministério Público em outra investigação, a que apura desvios nas obras do Rodoanel Sul, construído na gestão de José Serra (PSDB).

Segundo o site Petronotícias, que cobre o setores de energia, mineração e óleo e gás, Francisco teria transferido sua parte na sociedade seis meses depois para o filho de 18 anos. A publicação questionou o Metrô sobre o fato de a MG ter sido habilitada para a licitação mesmo não tendo balanço patrimonial – na prática, a empresa usou seu capital social de R$ 5 milhões como prova já que até onde se sabe nenhum serviço foi prestado por ela até a época da licitação.

Consultado pelo site, o Metrô de São Paulo respondeu que “a instalação das portas de plataforma permitirá a redução do número de interferências nas linhas de Metrô, aumentando a regularidade da circulação dos trens e principalmente, a segurança dos passageiros. O processo de licitação internacional foi feito com total lisura e transparência e seguindo o que exige a lei 8.666/93.

O Consórcio Kobra, vencedor da licitação, cumpriu todos os requisitos do edital, estando apto a atender as necessidades do contrato. O grau de parentesco ou idade das pessoas que fazem parte da composição societária de uma empresa não são abrangidos na referida lei. A Justiça indeferiu em primeira e em segunda instâncias pedido para impugnar a concorrência, mantendo o Consórcio Kobra como vencedor da licitação“.

Os sócios do consórcio Kobra: MG contrasta com demais por não ter histórico algum no tipo de serviço (Reprodução/Metrô de SP)

No entanto, o bom senso nos faz pensar se um projeto de R$ 342 milhões, cuja responsabilidade da MG no consórcio é de 7,32% (em tese de R$ 25 milhões), deveria ser assumido por uma empresa sem nenhuma comprovação prática de serviços prestados na área – em que pese a experiência técnica dos sócios (ou sócio) comprovada no setor de engenharia.

Segundo documentos fornecidos pelo consórcio Kobra, a MG terá a responsabilidade de prover adequações civis e reforço nas plataformas a fim de suportar o peso das portas, assim como adequar as salas técnicas das estações para os novos equipamentos, montagem, instalação e testes desses componentes, além de treinamento. Tudo isso em parceria com outra sócia brasileira, a Husk Eletrometarlúgica. As duas sócias da Coreia do Sul ficarão a cargo do projeto e fabricação das portas e itens acessórios.

Serviço traumático para o Metrô

Curiosamente, a sede do consórcio Kobra fica localizada nas mesmas salas do endereço legal da MG Engenharia, na avenida Paulista, mas a liderança do consórcio cabe à Husk, que tem apenas 2,33% de participação no consórcio. Toda a documentação da MG, assim como a fundação da empresa leva a crer que ela foi criada apenas para participar do certame, o que em tese não se trata de algo irregular, mas denota um único interesse, participar de uma licitação milionária.

A pergunta que se faz necessária é: você confiaria a execução de um serviço em sua casa ou mesmo empresa a um fornecedor sem clientes ou histórico? O que dizer então de um serviço complexo como o de instalação de portas de plataforma em estações que não foram planejadas para receber esses equipamentos e que continuarão sendo usadas durante os serviços, previstos para durar cinco anos?

O histórico do Metrô de São Paulo com as portas de plataforma tem sido traumático. Na Linha 2-Verde foram atrasos em relação ao sistema fornecido pela Alstom. Já na Linha 5-Lilás, a Bombardier somente agora começou de fato a integrar o equipamento em algumas estações enquanto na Linha 15 o sistema apresentou falhas constantes. Mas é o caso da estação Vila Matilde o mais emblemático. Única parada a ter portas de segurança na Linha 3-Vermelha, ela passou anos com os trabalhos parados enquanto a empresa escolhida para o serviço acabou tendo o contrato rescindido.

Nada disso garante que haverá problemas no novo contrato, mas parece ser um risco desnecessário permitir que empresas criadas meses antes de um leilão sejam habilitadas tão facilmente. Se a experiência dos dois sócios é assim tão vital para as demais empresas do consórcio nada as impediria de contratá-los como parte de sua equipe. Como está, o consórcio Kobra já inicia seus trabalhos sob desconfiança.

Tentamos encontrar algum contato dos representantes da MG Engenharia, mas sem sucesso. O site também enviou mensagens para os demais sócios do consórcio Kobra e aguardava retorno quando esta matéria foi publicada.

Portas de plataforma da Linha 5-Lilás: Metrô teve problemas com todos os fornecedores (Richard Mendelsohn)

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