Há 50 anos era criada a FEPASA

A antiga estatal administrou os trilhos paulistas entre as décadas de 70 e 90. Durante sua gestão as linhas que cortam as regiões oeste e sul da Grande São Paulo foram modernizadas adquirindo o formado de “trem metropolitano” adotado até hoje
Locomotiva 2021 preservada em Sorocaba (Jean Carlos/SP Sobre Trilhos)

No dia 10 de novembro de 1971 nascia a estatal paulista que gerenciou as ferrovias ao longo do estado de São Paulo. A empresa foi responsável pela gestão do tráfego de trens de carga, trens de passageiros de longa distância e pelo trem de subúrbio, que através de um grande processo de modernização se transformou no trem metropolitano, uma das raízes da atual CPTM.

A Ferrovia Paulista S.A., ou Fepasa, surgiu oficialmente no final do ano de 1971 sob circunstâncias bastante específicas. O governo do estado decidiu unificar as cinco grandes companhias ferroviárias do estado que foram gradualmente sendo encampadas pelo governo. Quando a última das empresas privadas, a Companhia Paulista de Estradas de Ferro passou ao domínio do estado a ideia de unir as malhas pode ser finalmente posta em prática.

As cinco ferrovias originais eram a Estrada de Ferro São Paulo Minas, Estrada de Ferro Araraquara, Companhia Mogiana, Companhia Paulista e a Sorocabana, esta última que cortava a grande São Paulo pelas regiões oeste e sul formando o que hoje se conhece como Linha 8-Diamante e 9-Esmeralda. Atualmente as duas linhas foram concedidas para a Via Mobilidade.

A empresa no início assumiu a operação do serviços com o material rodante existente. O parque de tração era composto em sua grande maioria por locomotivas elétricas e diesel-elétricas. Em São Paulo operava o precário serviço de subúrbio da Estrada de Ferro Sorocabana.

Composição “Carmen Miranda” partindo de Júlio Prestes

Originalmente as linhas eram mais extensas. A atual 8-Diamante fazia parada na cidade de Mairinque e em ocasiões em específicas chegava até o município de Sorocaba, enquanto isso o tramo ao sul, atual 9-Esmeralda, passava da estação de Varginha e ia até o alto da serra na estação de Evangelista de Souza. Apesar da distância, eram poucos os trens que iam até os limites dos subúrbios.

Composição da Série 4800 em rara aparição na estação Sorocaba

No ano de 1974 surgiu a ideia de realizar a total remodelação do serviço de subúrbio. A proposta ousada consistia no alargamento da bitola de 1m para 1,60m além da reconstrução de praticamente todas as estações existentes. Os antigos trens japoneses seriam gradualmente substituídos por novas composições francesas que operam até os dias de hoje.

A maior parte da receita da FEPASA foi proveniente do transporte de cargas, o serviço de passageiros, sobretudo o trem metropolitano, era visto como um investimento social, o que na essência constata-se verdade dado a quantidade de benefícios que o transporte de massa dá quando substitui outros modos de transporte, em especial aqueles com matriz energética não renovável.

Modernização dos subúrbios

Nos anos 90 a maior parte da malha estatal passou da gestão estadual para a esfera federal, sendo posteriormente concedida ao setor privado. As linhas de passageiros foram repassadas para a recém criada CPTM que herdou sua operação, bem como seus projetos, como o de dinamização da Linha Sul que foi responsável pela implantação das estações intermediárias entre Pinheiros e Santo Amaro, além do tramo sul da Linha 5-Lilás, também construído pela CPTM.

Mapa da Fepasa com antigos projetos

A FEPASA deixou como herança ao sistema ferroviário de passageiros uma nova concepção de transportes que foi aos poucos repassada para as outras linhas do subúrbio. O complexo de manutenção e o pátio de Presidente Altino também foram construídos pela antiga estatal.

Atualmente o que resta da FEPASA é um vasto patrimônio material, trens que ainda operam até hoje na extremidade da Linha 8-Diamante, funcionários de carreira e muitas memórias. Na capital são poucos os que têm na memória o nome da estatal, que ficou mais marcada pela população do interior com seus trens de longo percurso que deverão voltar a circular com uma concepção mais moderna do que a que era apresentada no final dos anos 90.

Locomotiva elétrica resgatada em Rio Claro

São várias as instituições que realizaram a preservação da memória ferroviária. A Sorocabana – Movimento de Preservação Ferroviária é uma das instituições que têm se dedicado em realizar a restauração, preservação e operação de material ferroviário histórico. Nestes 50 anos de FEPASA a organização se mobiliza com eventos, transporte de veículos históricos e um site para acomodar um museu virtual.

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11 comments
  1. Foi interessante observar pelas fotos os trens Carmem Miranda saindo de Júlio Prestes e o TUE Toshiba na gare da estação de Sorocaba, duas imagens raras que eu nunca tinha visto! A primeira vez em que eu andei num trem metropolitano foi na Fepasa lá por volta de 1987 entre Lapa e Osasco. Dez anos depois, eu fiz três viagens nos trens de longo percurso entre São Paulo e Campinas duas vezes e até Sorocaba uma vez, gostei das viagens na época, pena que já estava muito longe do excelente padrão da Paulista no seu auge e que na Sorocabana não havia mais os trens Ouro Branco, Ouro Verde, entre outros que eram muito bons em certa época das melhores das ferrovias quando o transporte de passageiros tinha um alto padrão!
    Infelizmente quando estarizaram acabaram com tudo e as concessões foram muito malfeitas, espero que com a concessão da CPTM a coisa não piore!

  2. Mesmo com várias instituições tentando preservar a memória ferroviária, a maior parte das locomotivas elétricas está ou em estado deplorável ou completamente destruída para virar metal de reciclagem; além disso, as antigas estações estão em grande parte abandonadas pelo interior, e a remoção da eletrificação feita pela ALL/Ferroban/sei lá qual era o nome da empresa na época, no trecho da Sorocabana, que poderia muito bem ter sido mantido (conforme análise de documento elaborado no processo de privatização), aumentou a poluição na região, além de condenar as poucas locomotivas elétricas plenamente operacionais à sucata.
    Por fim, mesmo as tentativas de preservação são muitas vezes falhas; vejamos o exemplo do museu de jundiaí, onde se encontram vários modelos insubstituíveis, todos em estado lamentável de preservação. O processo de privatização também acabou com os trens de longo percurso, alternativa barata, confortável e ambientalmente sustentável de viagem, não prevendo sua reativação ou reforma; o que hoje se planeja com os TICs não chega nem perto da extensão dos percursos um dia possíveis.

    1. A eletrificação das antigas Cia. Paulista e E.F. Sorocabana era obsoleta na década de 1980, sendo prevista sua substituição no projeto de US$ 550 milhões que a Fepasa enterrou no corredor de exportação Araguari-Santos.

      A remoção da eletrificação foi a melhor alternativa, dado que parte dos seus componentes era cancerígena e poluente (os transformadores usavam óleo ascarel, peças de amianto, etc), o custo da operação elétrica alto e a frota da Fepasa tinha apenas duas locomotivas elétricas modernas, com o restante obsoleto (e igualmente composta por amianto e outros materiais tóxicos).

      Não existe preservação sem o envolvimento de instituições de pesquisa, essas ligadas a universidades. O que existe hoje são ferroclubes privados, com interesses individuais se sobrepondo ao interesse coletivo, por isso a preservação é fraca.

      E os trens de longo percurso eram uma alternativa cara, desconfortável e irrelevante ambientalmente para a sociedade. De todos os trens existentes, só o trecho São Paulo-Campinas possui alguma viabilidade para ser reativado. O resto é composto de ferrovias com traçado obsoleto (com curvas que limitam a velocidade média a menos de 50 km/h), estações mal localizadas, cidades sem demanda (ligadas na ferrovia por interesses políticos), etc.

      A Fepasa foi uma tentativa mal sucedida do estado em manter ferrovias, após a desastrosa estatização da Companhia Paulista.

  3. vamos lembrar que a fepasa foi federalizada como pagamento de uma divida do banespa com a uniao. e depois o banespa foi vendido para o grupo santander. o dinheiro disso tudo, ninguem sabe, ninguem viu.

    o correto no Brasil era ser feito como em varios paises, como exemplo na alemanha, onde o governo fica responsavel pela infraestrutura. operadoras , que podem ser tanto estatais como privadas, tem o direito de passagem, seja para trens de carga, longo percurso o metropolitano. e assim o transporte de carga, que é lucrativo, acaba subsidiando o transporte de passageiros, q tem carate mais social (como escrito no texto, já era visto pela fepasa lá nos anos 70)

    o formato no Brasil de concessao foi totalmente errado. ficou restrito ao uso de uma unica empresa em determinada ferrovia. a empresa operou apenas o ramal que era lucrativo, deixando abandonado trens de passageiros, ramais nao lucrativos, recebendo poucas multas ou até mesmo multas abonadas.

    1. O dinheiro todos viram para onde foi. Serviu para o pagamento de dívidas. Com isso, o estado voltou a ter crédito nas instituições financeiras de fomento para voltar a investir em infraestrutura, por exemplo.

      A Fepasa nasceu endividada e viveu endividada. Um dia o povo de São Paulo cansou de pagar a conta dessa brincadeira de mau gosto e a empresa foi extinta. Simples.

      E a concessão foi feita da melhor forma possível para a época e tem sido um sucesso. Ferrovias não lucrativas foram separadas das lucrativas, que batem recordes de produção.

      Ferrovias não lucrativas nem deveriam existir (e só existiram por conta de capitalistas malandros e políticos populistas).

      1. e para onde foi o dinheiro do Banespa? e da nossa caixa? e das concessoes rodovarias?

        o estado mais rico do país continua endividado e cada vez menos poder de investimento.

        esse discurso nao convence.

        a concessao nao foi feita da melhor forma possivel, visto o abandono que virou muitas ferrovias.

        ferrovias lucrativas nao subsidiam ferrovias nao lucrativas ou projetos de novas ferrovias. ferrovias lucrativas apenas enchem o bolso de um conglomerado empresarial que ganha rios de dinheiro em cima de benesses do estado através de politicos.

        as ferrovias nao devem ser classificadas em lucrativas ou nao lucrativas. devem ser classificadas por viabilidade. se tem viabilidade para o transporte de passageiros, turistico ou algo q venha trazer retorno para a sociedade, caberia ao estado fazer com que os trechos lucrativos subsidiassem esses, com em varios paises do mundo acontece. e se nao tem viabilidade para nada, q seja desativada e vire outra coisa q nao seja uma ferrovia abandonada.

        mas aqui é Brasil, país que nao é sério, nao visao a longo a prazo nem autoridades que pensam no progresso.

        1. Se uma ferrovia é feita para dar prejuízo, algo está errado.

          E São Paulo hoje possui todas as suas dívidas equacionadas, permitindo obter empréstimos e uma boa nota de Capacidade de Pagamento (Capag) no Tesouro Nacional.

          A criação da Fepasa foi orientada por empresas francesas entre 1968 e 1970. Depois, as mesmas empresas francesas conseguiram fazer a Fepasa investir mais de US$ 1 bilhão em um programa de modernização (subúrbios e cargas) que se tornou impagável ao longo das décadas e acabou abandonado incompleto. Em 1994 a Fepasa devia mais de US$ 3 bilhões em dívidas de curto prazo.

          O estado foi proibido de tomar empréstimos entre 1992 e 1996 por conta de dívidas de projetos e obras (antigamente os governadores lançavam projetos e obras e usavam o Banespa como avalista e ou financiador de empréstimos) e isso fez com que centenas de obras ficassem paralisadas no estado. Com a venda do Banespa (que iria quebrar sem essa venda), parte dessas dívidas foi paga e o estado recuperou sua capacidade de investir e pagar em dia cada empréstimo.

          Esse problema de políticos usando bancos estatais para avalizar e ou financiar diretamente obras e projetos ocorreu no Brasil inteiro durante a ditadura e o período inicial da redemocratização até que o Banco Central acabou com a farra em 1994. No Rio o Banerj foi avalista dos empréstimos do metrô do Rio (feitos entre 1968 e 1980) e acabou sendo privatizado por ter avalizado uma quantidade de dívidas maior que seu patrimônio.

          1. Transporte público como negócio não é superavitário em lugar nenhum do mundo. Sua função é social e seu ganho é para toda a sociedade, por isso o subsídio.

            Sobre a divida do estado de SP, o estado tinha em 1994 uma divida de 34,1 bi . Em dezembro de 2000, a dívida saltou para 84,2 , mesmo com privatizaçoea.e concessoes arrecadando 32,9 bi. Hoje a divida publica consolidada do Estado é de 312 bi.

  4. O problema ferroviário brasileiro é crônico.
    Ironicamente o principal culpado pelo desfecho das ferrovias brasileiras são as próprias ferrovias.
    Quando foram implantadas seu único objetivo era escoar matérias primas (sobretudo o café) até os portos para abastecer o mercado externo.

    Diferente das ferrovias americanas, canadenses e australianas, onde seu propósito era de integrar o país e realizar o abastecimento interno transportando diversas mercadorias além das exportações.

    Como nossas ferrovias estavam voltadas ao abastecimento do mercado externo, procurou-se construí-las na forma mais barata – bitola métrica, lastro com terra e traçados sinuosos para evitar o máximo possível a construção de viadutos e túneis.
    Com a crise de 1929 muitas dessas empresas ferroviárias foram a bancarrota sendo adquiridas pelo governo para salvá-las, a sorocabana é um exemplo delas.
    Poucas resistiram á crise na época como a Companhia Paulista, São Paulo Railway e Central do Brasil.

    Em relação à Fepasa, nem deveria ter sido criada, com a existência da Companhia Paulista que se não tivesse sido sabotada estaria operando até hoje com modernos trens de cargas.

    Sobre qual matriz energética à ser utilizada, a tração diesel-elétrica é mais adequada pelo fato de nosso país ter adotado o modelo americano de transporte de cargas, com trens longos em sistema locotrol ( 2 Locomotivas na frente + 2 Locomotivas no meio ou atrás do trem), modelo a qual é perfeito para o Brasil por ser um país de dimensão continental.
    Este esquema seria totalmente inviável para ferrovias eletrificadas, as quais são adequadas em países pequenos como os da Europa.

    No quesito trens de passageiros o poder público tem que subsidiar, por ser um transporte que NÃO traz lucro, porém consiste em um ganho social como alternativa de transporte em comunidades distantes.
    Um bom exemplo é os trens de passageiros da Vitória-Minas e E.F. Carajás.
    Mas para isso seria preciso uma linha paralela à de cargas para não prejudicar os trens cargueiros. No caso das ferrovias citadas à cima, elas são duplicadas e os trens de longa distância são formados por 15 carros a uma frequência de um trem por dia.

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