O contrato de concessão da ViaMobilidade pode ser rompido?

Possibilidade foi aventada pelo Ministério Público na semana passada. Entenda quais são as sete formas em que a concessão das linhas 8-Diamante e 9-Esmeralda pode ser encerrada
Composição C43 da ViaMobilidade (Jean Carlos)

Nas últimas semanas, a ViaMobilidade, operadora das linhas 8-Diamante e 9-Esmeralda, ficou em evidência por conta das recorrentes falhas e da investigação que está sendo feita por parte do Ministério Público. Em meio às discussões, levantou-se a possibilidade do rompimento do contrato de concessão.

A situação levantou a questão sobre como o contrato de concessão das Linhas 8 e 9 lida com um possível rompimento por uma das partes. Essa possibilidade é prevista no Capítulo XII a partir da cláusula 53. Ao todo, o contrato elenca sete formas da concessão delegada à ViaMobilidade ser rompida.

Trens no pátio Presidente Altino (Jean Carlos)

1 – Advento do termo contratual

O advento do termo contratual é o rompimento da concessão em decorrência do prazo estabelecido. No caso das linhas 8 e 9 o prazo de concessão será de 30 anos e após este prazo é acionado o rompimento por advento.

Também é estabelecido que três anos antes do término do contrato a concessionária deverá submeter ao poder concedente o seu “Plano de Gestão e Desmobilização de Ativos”. Durante o período a concessionária deverá cooperar com o poder concedente  para a sucessão do contrato, seja por ente estatal ou por sua sucessora privada.

Com o fim do contrato, a concessionária não fará jus a qualquer tipo de indenização que esteja relacionada aos investimentos em bens reversíveis.

Trem chegando em Julio Prestes (Jean Carlos)

2- Encampação

A encampação é o rompimento do contrato motivado por ação justificada do poder concedente. Para tal, é necessária a emissão de uma lei específica que autorize a retomada das linhas para o estado.

Por se tratar de um rompimento durante a vigência da concessão, a concessionária terá direito a uma indenização. Entre os valores indenizados estão as multas e ônus de contratos firmados pela concessionária e rompidos na ocasião da encampação. O pagamento dos valores para a concessionária é condição para que o estado assuma novamente o controle das linhas.

3 – Caducidade

A caducidade é o rompimento do contrato motivado pela inexecução total ou parcial dos serviços. A caducidade é acionada pelo poder concedente que abrirá processo administrativo onde a concessionária terá amplo direito de defesa.

Tela de informações com o logo da ViaMobilidade (Jean Carlos)

As condições para o acionamento da caducidade são diversas, sendo esse considerado um fator de risco real para uma eventual perda da concessão por parte da ViaMobilidade. Dentre as hipóteses para a caducidade estão:

  • Perda ou comprometimento das condições econômico-financeiras, técnicas ou operacionais;
  • Descumprimento de cláusulas contratuais que comprometam o serviço concedido, bem como passageiros e funcionários;
  • Paralisação dos serviços por culpa ou dolo da concessionária (exceto força maior);
  • Transferência de controle sem anuência do poder concedente;
  • Não atendimento às intimações do poder concedente;
  • Multas que somam mais de 4,5% do valor estimado do contrato.

Dentre as condicionantes para o acionamento da caducidade destaca-se o item vii da cláusula 57.3:

“inadequações, insuficiências ou deficiências graves e reiteradas da prestação do SERVIÇO CONCEDIDO, caracterizadas pelo atingimento, por mais de 3 (três) períodos consecutivos, de resultado igual ou inferior a 0,5 (zero vírgula cinco) em um mesmo INDICADOR DE DESEMPENHO previsto neste CONTRATO (IQM ou IQS);”

O índice de qualidade do serviço (IQS) e o índice de qualidade da manutenção (IQM) são a média ponderada de diversos índices de desempenho e qualidade, sendo o valor máximo para ambas as notas 1,0. O site fez uma matéria bastante detalhada de como é avaliada tecnicamente a operação da ViaMobilidade nas Linhas 8 e 9.

Composição partindo da estação Lapa (Jean Carlos)

A concessionária será alertada pelo poder concedente das irregularidades contratuais e terá prazo de 30 dias para sanar os problemas existentes. Caso não sejam resolvidos as adversidades, o poder concedente poderá acionar a cláusula de caducidade.

Com a caducidade contratual, o poder concedente terá poderes para:

  • Assumir as operações no local e estado em que se encontrarem;
  • Ocupar e utilizar os locais, equipamentos e recursos humanos para a continuidade dos serviços;
  • Reter créditos da concessionária caso a garantia de execução seja insuficiente para ressarcir o poder concedente.

Existe ainda o pagamento de uma multa contratual no valor de R$ 200 milhões ao poder concedente. Esta multa não anula as demais penalidades aplicadas à concessionária ao longo do período de concessão.

Entretanto, a cláusula 57.2 estabelece que o poder concedente poderá usar de seu “juízo de conveniência e oportunidade” para aplicar ou não a caducidade. Nesta situação o governo poderá aplicar penalidades previstas no contrato, realizar a intervenção na concessão ou obrigar a venda da mesma para outros grupos. 

4 – Rescisão

A rescisão é o rompimento do contrato motivado por iniciativa da concessionária, em casos como, por exemplo, o não cumprimento das normas contratuais por parte do poder concedente.

A resilição unilateral poderá ser exigida quando ocorrerem situações de força maior não seguráveis e que impactem os serviços de forma irreparável, ou por um período superior a 90 dias. Outra hipótese é a inviabilidade de obtenção de financiamento de longo prazo pela concessionária até o segundo ano da operação comercial.

Poderá haver rescisão em caso de licitação do contrato, que dependerá de acordo entre o poder concedente e a concessionária. Os procedimentos deverão garantir a continuidade dos serviços até a assunção da sucessora.

A rescisão por processo arbitral ocorre quando a concessionária instaura ação contra o poder concedente por quebra de normas. Neste caso, a concessionária deverá acionar o governo em pelo menos 30 dias. Os serviços deverão ser continuados até a decretação da rescisão.

Composição chegando a estação Granja Julieta (Jean Carlos)

5 – Anulação decorrente de vício ou irregularidade

A anulação é o rompimento do contrato em caso de irregularidade no processo licitatório, em sua formalização ou em cláusula essencial que comprometa a operação das linhas.

Em caso de anulação do contrato pode ser feito o pagamento de indenizações. Caso o fato seja imputável às irregularidades da concessionária a indenização será calculada como se fosse caducidade. Em caso de responsabilidade do poder concedente, a indenização será paga como se fosse extinção antecipada de contrato.

6 – Falência, extinção ou recuperação judicial

O contrato também poderá ser rompido caso a concessionária vá a falência ou entre em recuperação judicial, de tal forma que a prestação dos serviços seja diretamente prejudicada.

No caso da falência, o poder concedente tomará posse de todos os bens reversíveis da concessionária e assumirá de forma imediata a operação dos serviços.

Composição trafegando na Linha 9-Esmeralda (Jean Carlos)

7 – Força maior

A ocorrência de casos de força maior para o rompimento do contrato também está prevista. Neste tipo de situação são consideradas circonstancias atipicas e de alto impacto que não podem ser previstas, algumas das condicionantes são:

  • Guerras nacionais e internacionais;
  • Atos terroristas;
  • Contaminação nuclear, química ou biológica (incluindo epidemias e pandemias);
  • Embargo comercial por nação estrangeira;
  • Eventos naturais de alto impacto (terremotos, furacões ou inundações).

Nesta situação, o poder concedente poderá dar ordem para que a concessionária cumpra o serviços dentro do que é possível, da mesma forma o governo cumprirá sua parte dentro das limitações do caso fortuito.

As obrigações contratuais, bem como os indicadores de desempenho da concessão, caso sejam comprovadamente impactados por casos de força maior, não serão passíveis de penalização. 

Ambas as partes, governo e concessionária, devem se comprometer em empregar medidas e ações para minimizar o efeito dos casos de força maior.

Estação Jurubatuba (Jean Carlos)

Conclusão

A hipótese de encerramento do contrato de concessão parace improvável nesse momento, a despeito das falhas. O prejuízo de uma ação como essa será imenso para ambos os lados e não interessa a ambos. Para o governo do estado, seria uma mancha grave no seu plano de concessões, já para a ViaMobilidade, a colocaria numa situação de desconfiança no mercado, por exemplo.

Em todo o caso, qualquer tipo de rompimento de um serviço desta natureza é precedido por um longo processo administrativo que tenha como principal foco a continuidade dos serviços sem causar impacto para a população.

Cabe lembrar que as ações do poder concedente são decisivas para acionar ou não determinados regramentos. A depender do interesse da gestão estadual, atual ou futura, e dos planos de ação da concessionária a concessão pode ou não perdurar pelo tempo estabelecido em contrato que é de 30 anos.

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11 comments
  1. Para que foi feita esta concessão? O serviço melhorou? Será que sempre a iniciativa privada oferece serviços melhor que o Estado. O transporte público é subsidiado até nos Estados Unidos.

    1. Foi feita para melhorar as vias, energia e sinalização, comprar novos trens, e contratar novos funcionários, só a contratação de funcionários foi feita, os demais estão sendo feitos e levarão meses a até anos pra estarem totalmente concluídos e funcionando perfeitamente.
      Agora se não tivessem feito a concessão, ia ficar tudo do mesmo jeito e sem funcionários novos, faz anos que CPTM e Metrô não contratam e estão proibidos de contratarem, e todo mês o número de funcionários diminui, por aposentadoria, morte, mudança de emprego e a cada nova estação que surge tem que ficar remanejando funcionário, até chegar a hora que simplesmente não terá ninguém pra colocar em uma nova estação.

      1. Não, só parou de abrir novos concursos para facilitar essas concessões furadas. Não adianta vc querer defender essa merda de empresa que só esta administrando essas linhas por favorecimento político. Ou vc é um funcionário dela que também quer acreditar que está melhorando alguma coisa por aí?

    2. Com certeza não foi por eficiência. O custo que essa concessão vai trazer pro estado permitiria contratar novos funcionários, novos equipamentos e resolver outros problemas da via. Se o intuito fosse realmente recuperar algo teriam começado pelas linhas 11 e 12, não pelas melhores linha da CPTM até então. Fora que nem a unificação das estações Lapa foi colocada no edital. Como esperar investimentos se a empresa precisa lucrar durante o processo? Outro fato é que curiosamente a CCR ganhou o edital, fechando toda a região Oeste.

  2. Sinceramente acho que não vai dar em nada, já está feito agora a Viamobilidade teve 1 ano de operação assistida junto a CPTM e não fazer o básico e pedir ajuda a mesma é muita falta de responsabilidade, isso mostra que privatização não vale a pena.

  3. nem que tiver que colocar o paese todo dia, nem que o estado tenha que colocar a equipe da CPTM para atuar junto, os caras vao acabar com essa concessão.

    isso tudo vem sendo orquestrado a muito tempo, há muitos interesses envolvidos. obvio que o interesse da sociedade e do passageiro é o que eles estao menos preocupados, se é q houve 1% de preocupaçao em algum dia.

    como já vem se falando há muito tempo, é uma concessao desnecessaria q só foi realizada pensando em atender os interesses de um grupo pequeno do grande empresariado, como acontece tambem em outras concessoes e tercerizaçoes. é o povo que utiliza a bandeira do estado minimo e enxugamento da máquina, mas q eles proprios se fartam do dinheiro publico e incham e burocratizam a maquina estatal com contratos obscuros como esses.

  4. Essa concessão aconteceu porque o povo desde 2018, está pedindo privatização seja em esfera Federal ou Estadual. Está aí o resultado!

    Culpa do povo! Continuem votando em políticos/acionistas.

  5. Não descarto uma falta de comunicação durante a própria licitação, aonde talvez a situação real das linhas não tenha sido totalmente exposta às claras.
    Até porque, diferentemente das duas linhas do Metrô que foram entregues “zeradas”, sabemos que a CPTM ainda demanda muitos investimentos e reestruturações na sua rede.

  6. Bom tarde a todos
    Concordo com o Guile eles não vão acabar com esta concessão, nem que para isto tenha que colocar passe todos os dias, nem que para isto tenha que colocar os funcionários da CPTM lado a lado com os funcionários desta concessionária, para aprender o serviço direito, nem que precise chamar os vingadores para ajudar, afinal de contas a lambança da concessão já foi feita, e inclusive já há funcionários da CPTM atuando ainda nas bilheterias desta concessionária, visto que quando foi realizado a concessão tiveram uma ” visao” que as estações da linha 8 e 9 não iriam precisar mais de bilheterias, acho que deu ruim

  7. Hoje na Bahia, a CCR fez um trem entrar no outro. A mesma CCR daqui. Fica o aviso….

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