A discussão entre o governo do estado e a concessionária VEM ABC, que foi vencedora da licitação para implantação da Linha 18-Bronze do Metrô, teve um novo capítulo no final de setembro.
Após a rescisão unilateral do contrato por parte da gestão Doria, a empresa solicitiu a arbitragem de um órgão internacional para apurar a indenização a ser paga pelo gestor público.
No final de julho, a VEM ABC havia apresentado sua alegações iniciais em que requer o pagamento de R$ 1,3 bilhão pelo fim injustificado da concessão de 25 anos.
A empresa afirmou que o governo João Doria usou de expedientes inexistentes no contrato para encerrá-lo em favor da substituição do monotrilho por um corredor de ônibus ‘BRT’ oferecido pela Metra, empresa que opera as principais linhas desse modal na região do ABC.
Em 27 de setembro, a Procuradoria Geral do Estado, órgão jurídico que representa o estado, se defendeu das acusações e apresentou sua versão dos fatos.
Segundo os advogados, o governo não teria descumprido o contrato já que, na visão deles, o poder público em nenhum momento deixou de se esforçar para fazer sua parte na divisão prevista na PPP (Parceria Público-Privada). A principal responsabilidade do estado era garantir os recursos financeiros, incluindo o pagamento das desapropriações.

Contrato assinado, mas sem valer
A alegação do estado é que esse objetivo só não foi atingido por fatores externos, alheios à vontade dos gestores desde 2014, quando o contrato foi assinado. Como se sabe, o governo federal rebaixou a nota de crédito de São Paulo por um longo período, mas que foi elevada novamente no governo Temer.
“É importante ressaltar que o não cumprimento da obrigação supramencionada decorre de eventos totalmente alheios à vontade do Requerido [governo estadual] e sempre estiveram relacionados às vicissitudes da União e seus agentes em disponibilizar as linhas de crédito aptas à viabilização da PPP,” diz trecho da defesa.
A equipe que produziu a peça mostra um esforço enorme para tentar desvincular do contrato a chamada “etapa preliminar” da concessão, quando existiam metas estabelecidas para ambos os sócios e que foram cumpridas pela VEM ABC, ao contrário do estado.

O argumento utilizado é que a etapa preliminar do contrato de concessão, mesmo incluída nos parágrafos do instrumento, não faria parte da concessão em si. “assim, a Etapa Preliminar encontrava-se no lapso temporal em que o Contrato de Concessão vigorava, mas a Concessão ainda não era vigente,” diz o texto da PGE.
O governo Doria também ignora sumariamente os termos de rescisão existentes no contrato redigido pelo próprio e que não prevê a rescisão por parte do estado, para afirmar que “a possibilidade de resilição unilateral de um contrato não precisa estar expressamente prevista na lei específica que o rege, como a Lei de Concessões ou a Lei de Parcerias Público-Privadas. Trata-se de prerrogativa contratual assegurada a qualquer contratante, no regime jurídico brasileiro“.
Valor ínfimo de indenização
Embora não assuma qualquer culpa pela iniciativa unilateral de encerrar o contrato, que seria inviável financeiramente, a despeito de análise favorável da FIPE, a PGE questiona as projeções otimistas em sua visão sobre o potencial de receita da concessão.
Alega que usar os dados constantes no edital da licitação “desconsidera as recentes transformações no cenário macroeconômico brasileiro, de que não se tinha conhecimento e que não foram antecipadas à época das modelagens iniciais do projeto”. No entanto, não explica se a regra valeria num cenário inverso, em que a economia do país superasse as projeções.

Por conta disso, a proposta de indenização ignora qualquer ganho frustrado com a concessão, vencida há sete anos e cujo início deveria ter ocorrido originalmente em 2018. Em vez disso, o estado se propõe a pagar um valor de apenas R$ 43,7 milhões com data-base de agosto de 2020.
A PGE ainda se nega a arcar com as custas do processo, nesse caso fazendo uso das cláusulas do contrato, o mesmo que foi ignorado nos trechos afrontados pela decisão do governador.
O processo de arbitragem ainda deverá se arrastar por alguns meses, com novas alegações e produção das provas. Só então os três indicados para julgar o caso formarão sua decisão.