Uber Transit pega carona no governo do estado para atrair novos usuários

Recurso que integra aplicativo de carona com o transporte público na Grande São Paulo passa a oferecer opção de metrô, trem e ônibus, mas incluir pagamento deve ser missão quase impossível
O secretário Alexandre Baldy e a diretora-geral Claudia Woods: tanto governo quanto Uber pegaram carona para parecerem mais antenado e preocupado com a mobilidade (GESP)

O advento dos aplicativos de carona ainda é uma imensa dor de cabeça para prefeituras e outros órgãos de controle do trânsito e do transporte nas grandes cidades do mundo. Não se sabe como regulamentá-los nem como manter seu convívio com táxis quanto mais vê-los tirando passageiros de ônibus e trens, por exemplo. A questão trabalhista é outra incógnita à medida que essas empresas atraem pessoas que buscam uma saída para o desemprego e mesmo como complemento de renda.

A origem do problema está, é claro, no transporte público deficiente. Sem uma rede integrada e capilarizada o suficiente é impossível reduzir o transporte individual nas grandes cidades ainda mais que o custo e qualidade estão longe do ideal, seja em Londres, meca do transporte público, ou em São Paulo, uma das cidades em que o uso de automóveis é elevado.

Ou seja, o aplicativo de carona tornou-se uma solução de mobilidade capaz de atrair proprietários de carros como também gente que usa o transporte público, sobretudo o ônibus em regiões onde esse veículo compartilha vias e acaba saindo mais caro muitas vezes. O reflexo desse quadro está em um aumento descomunal de veículos circulando pelas cidades oferecendo viagens em várias modalidades. A explosão desses aplicativos no Brasil, por exemplo, pode ser notada pelas vendas diretas de veículos que abastecem esse mercado nos últimos anos.

Portanto, em tese os aplicativos são concorrentes do transporte público, mas o Uber, a plataforma mais famosa do gênero, tem tentando evitar esse conflito. Como? Oferecendo o serviço Uber Transit, que passou a incluir ônibus, trens e outros modais coletivos nas opções disponobilizadas para seus clientes. O recurso já é oferecido em algumas cidades no mundo e acaba de chegar à São Paulo, a primeira no Brasil a integrar o transporte individual com o público.

A ideia da startup é deixar de ser apenas uma opção de mobilidade para tentar se tornar um aplicativo multimodal. É uma resposta ao avanço de outros aplicativos como o Google Maps e o Citymapper. Em princípio, a empresa faz crer que está abrindo mão de alguns usuários ao listar o transporte público, mas trata-se de uma interpretação ingênua. A razão é que o automóvel pode acabar atraindo novos clientes que hoje utilizam, por exemplo, o metrô como modal principal e o ônibus como opção nas “pontas”. Nesse caso, esse cliente acabaria gastando menos com o Uber.

Em outras palavras, o Uber quer ampliar sua base de usuários e atrair hoje quem não possui o aplicativo instalado por não considerar uma viagem pura de carro. Mas não é só. A empresa também tem buscado integrar o pagamento do transporte público ao seu aplicativo e assim controlar mais recursos financeiros mesmo que não consiga algum tipo de “comissão” dos governos. A cidade de Denver, nos EUA, topou integrar a tarifa com o aplicativo, mas essa possibilidade não é vista com bons olhos por outras metrópoles.

Tela do Uber Transit

Londres, por exemplo, tem tido um relacionamento duro com a Uber. A TFL, empresa que controla todo o transporte na capital britânica, pressionou o Uber a verificar a identidade de seus motoristas para evitar fraudes e riscos aos passageiros. A startup chegou a perder a licença de operação, mas a retomou meses atrás sob condições de se tornar mais transparente. Apesar disso, a TFL tem deixado claro que não faz nem fará parceria com empresas privadas.

Fome com a vontade de comer

A introdução do Uber Transit em São Paulo, que começou em abril, faz uso de banco de dados dos ônibus da região metropolitana e dos trens de Metrô e CPTM para fornecer informações confiáveis para o usuário. Era para ser algo trivial e que hoje também existe em outros aplicativos, porém, a Uber encontrou um “parceiro” ideal em seu lobby em busca de uma imagem politicamente correta no Brasil, o governo João Doria.

Nesta quinta-feira, o secretário dos Transportes Metropolitanos, Alexandre Baldy, apresentou o projeto de integração com a diretora-geral do Uber no Brasil,  Claudia Woods. Juntos, eles anunciaram o recurso com pompa de inovação e causaram confusão entre os repórteres de editorias que não acompanham o transporte público. Para muitos, a parceria envolvia a cobrança de tarifa de trens e da EMTU pela Uber quando essa possibilidade é remota por questões técnicas – Metrô e CPTM ainda não aceitam pagamento eletrônico de forma definitiva.

Na verdade, a iniciativa do Uber, como deixou claro Baldy, não contou com a participação do estado nem mesmo das prefeituras. Houve encontros para entender como as informações do transporte público são disponibilizadas hoje gratuitamente e coube apenas à empresa investir nessa adaptação.

Embora o Uber Transit também mostre os ônibus da capital nenhum representante do prefeito Bruno Covas esteve na coletiva (GESP)

No entanto, ao anunciar a integração, o governo Doria e o Uber compartilharam entre si o que mais buscam atualmente, uma imagem conectada ao futuro, no caso do governador, e a preocupação com a mobilidade, no caso da startup.

Na prática, no entanto, o Uber e seus concorrentes continuam a ser mais um problema que solução para a administração pública. A evidência mais clara sobre isso estava implícita na ausência de representantes da prefeitura de São Paulo na coletiva. Embora o atual prefeito Bruno Covas seja aliado do governador, ninguém apareceu, a despeito de o Uber Transit também mostrar dados dos ônibus da capital.

Não precisa ser um gênio para entender que o problema dos aplicativos de carona está no colo das prefeituras, que também detém o controle dos táxis nas cidades brasileiras. Em outras palavras, seria algo estranhíssimo se algum prefeito resolvesse sentar ao lado da diretora da Uber ou qualquer outra empresa como ela.

É claro que os aplicativos de carona têm sua importância assim como os táxis e continuarão como parte do ecossistema de mobilidade. No entanto, São Paulo precisa sim de um transporte público melhor, mais pontual, seguro, de preço justo e sobretudo rápido para que o uso do transporte individual, seja próprietário ou por meio de serviços, torne-se apenas um complemento e não o principal modo de se deslocar em nossa metrópole.

Embora aplicativos de carona sejam importantes, prioridade de um governo tem de ser o transporte de massa

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  1. Parabéns pelos artigos no site. Em comparação com outros blogs que acompanho, aqui os textos são muito bem escritos e bem mais aprofundados nos temas que abordam.

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