Embora tenha alegado ter feito um investimento de mais de R$ 1 bilhão em seu primeiro ano de concessão, a ViaMobilidade nas Linhas 8 e 9 continua devendo um serviço confiável. O que se viu até aqui foi uma regressão significativa na qualidade da operação dos dois ramais, que já deixavam a desejar em alguns aspectos mesmo no tempo da CPTM.
É inegável dizer que o número de falhas na operação das Linhas 8 e 9 aumentou de maneira vertiginosa no último ano. São vários dados que corroboram com esta impressão. Segundo levantamento realizado pela Rede Globo, foram registradas 132 falhas nas linhas concedidas.
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A título de comparação, esses números foram de 19 falhas em 2021 e 7 falhas em 2020, ainda com a operação realizada pela CPTM. Em menos de um mês de operação a empresa já precisou acionar o sistema PAESE por conta de uma falha no sistema de energia.

Descarrilamentos
Um descarrilamento pode ser considerado uma falha severa, uma espécie de erro crasso da operação. Uma ocorrência desta natureza pode gerar diversos problemas como danos na via, nos trens e, em casos severos, ferir os passageiros.
Durante o primeiro ano de operação foram registrados ao menos sete descarrilamentos. Alguns dos mais evidentes foram os ocorridos em Domingos de Moraes e Lapa, apesar deste último ter sido causado por agente externo.

Batida e morte de funcionário
A morte de um funcionário que atuava na manutenção em uma sala técnica na estação Pinheiros e a batida de um trem na estação Júlio Prestes foram fatos relevantes e que ficaram marcados no histórico da empresa.
Não se sabe exatamente quais ações foram tomadas no âmbito da segurança do trabalho, mas em termos de operação de trens, uma série de redundâncias foram aplicadas. Desde câmeras nos trens até placas novas, dormentes pintados, sinalização refletiva, entre outros.

Sujeira
As condições de limpeza das estações e trens metropolitanos das Linhas 8 e 9 caiu quando comparado ao período da CPTM. Nos primeiros meses de concessão, não era raro encontrar trens sujos e vias completamente tomadas pelo lixo.
A concessionária aumentou o efetivo das equipes de limpeza. O site acompanha regularmente a operação das linhas e constatou melhoria neste quesito, mas ainda é necessário mais trabalho. Ações educativas foram implantadas em algumas estações para conscientizar passageiros quando a limpeza.

Trens velhos
A alegação do presidente da CCR Mobilidade, Marcio Hannas, sobre a suposta idade avançada dos trens da Série 7000, em parte cedidos em caráter de empréstimo, mostra uma possível fuga dos problemas reais: falta de manutenção adequada.
Os trens possuem aproximadamente 12 anos de idade, o que representa apenas ¼ da vida útil de uma composição. Na teoria, são trens relativamente jovens que não deveriam apresentar problemas recorrentes.
Durante o período em que estavam com a CPTM as composições operavam praticamente sem anormalidades. Não é difícil verificar na mídia em geral casos onde os rodeiros dos trens chegam a pegar fogo.
Já os trens mais antigos, da Série 5400, praticamente deixaram de rodar na extensão da Linha 8-Diamante, sendo substituídos por composições mais novas da Série 7500, que operam em caráter de empréstimo.

Mobilização social
Nas redes sociais os passageiros que utilizam as Linhas 8 e 9 com frequência relatam falhas constantes nas linhas da empresa, o que gerou inclusive a criação de perfis de denúncia acerca de relatos de má prestação de serviço.
A fiscalização por parte da sociedade gera inclusive movimentos que pedem o fim da concessão, algo que já está na mira do Ministério Público e que vem ganhando força a cada incidente notável.
A “Supervia paulistana”
Não é difícil encontrar diversos apelidos em tom sarcástico para a concessionária das Linhas 8 e 9. Desde um perfil de redes sociais batizado de “Via’I’mobilidade” a comparações com a operadora dos trens metropolitanos do Rio de Janeiro, a Supervia, cujo serviço é considerado precário há vários anos.
Os trens do Rio de Janeiro foram repassados para a iniciativa privada ainda em 1998. Ao longo dos anos alguns investimentos foram realizados, como a compra de novos trens, mas atualmente a empresa encontra-se em uma situação de colapso.
Lá as falhas não são novidade, intervalos completamente desregulados e estações com aparência de abandono. Apesar da gravidade do subúrbio carioca ter atingido patamares alarmantes, existe um receio de que a situação se reproduza em São Paulo.
Mirando no padrão de qualidade obtido na Linha 4-Amarela, que é um exemplo de operação para sistemas de transportes dentro e fora do Brasil, a ViaMobilidade nas Linhas 8 e 9 se deparou com um pesadelo: a complexidade de operar trens metropolitanos.

Opinião
Frustração: essa é a palavra que pode definir o primeiro ano de operação da ViaMobilidade nas Linhas 8 e 9. A expectativa era de transformar os trens da velha CPTM, “arcaica e retrógrada”, em um transporte rápido e eficiente. Em pouco tempo, o trem metropolitano iria se transmutar em metrô de superfície.
No entanto, gota a gota a realidade de impôs. A euforia se converteu em cautela, a cautela se transformou em atenção e aos poucos um clima nebuloso surgiu: onde estava o expertise acumulado com três outras concessões sobre trilhos no Brasil?
Descobriu-se então que debaixo da cama que representa as Linhas 8 e 9 havia uma espécie de “bicho papão”. Uma série de questões pendentes, a realidade das linhas de trens metropolitanos, quase sempre negligenciadas pelo estado.
Viu-se então que a CPTM não só operava linha de trens, ela operava milagres pois, com um orçamento tão apertado e falta de recursos para investimentos estruturais, as falhas não ocorriam com a mesma frequência.

Como já referido em um artigo do começo de 2022: a disparidade entre a experiência dos funcionários da CPTM que tinham décadas de serviço e os funcionários da ViaMobilidade é muito grande.
Isso não é necessariamente um pecado. Os funcionários de linha de frente, sejam maquinistas, agentes de segurança e de manutenção são os menos culpados pela situação atual. Experiência se adquire com o tempo e, é natural que estes profissionais ganhem a envergadura necessária para operar tal sistema ao longo dos anos.
O alerta aqui fica aos gestores, públicos e privados, que possuem parte nesta odisseia ferroviária onde o passageiro é a principal vítima. Fazer ping pong de responsabilidades, tentando achar um culpado para os problemas, pouco melhora a operação.
Quais ações podem ser feitas hoje para melhorar a vida dos passageiros? Dinheiro para investimentos resolvem apenas metade dos problemas, a outra metade é a atitude para encarar de frente todos os problemas.
Se servir como inspiração, esperamos ver notícias como esta ao longo dos próximos anos:
